Pedir dinheiro é um ato aceitável quando o pedido parte de uma criança e é endereçado a um adulto, mas em determinado momento há um limite.
Não há lei proibindo que um adulto peça dinheiro a outro adulto, mas há uma regra social que condena esse comportamento. A regra pressupõe que um adulto deve ser capaz de ganhar seu próprio dinheiro por meio de trabalho, e não mediante o uso de processos onde não haja uma contrapartida de sua parte.
Assim, chega uma época da vida de uma pessoa em que ela começa a ser estimulada a tentar deixar de aceitar a ajuda dos adultos e começa a ser estimulada a procurar ganhar seus próprio dinheiro por meio de algum tipo de trabalho.
Evidentemente, um adolescente não possui capacidade de ganhar muito dinheiro, e então, acaba aceitando pequenos empregos temporários, acaba ajudando os pais em casa em alguma tarefa remunerada, começa a aprender os rudimentos do comércio com outras pessoas e começa a perceber os limites que a vida impõe quando não se dispõe de uma fonte de renda previsível e segura.
Quando éramos pequenos, minha mãe sempre se esforçava para que aprendêssemos algum tipo de tarefa que pudesse render algum dinheiro. Éramos pobres, meu pai não tinha renda regular, vivíamos endividados, dependendo de crédito de pessoas generosas, e minha mãe fazia o que podia para complementar o rendimento familiar.
Assim, se ela precisasse fazer doces para vender para algum conhecido ou para algum comércio, ela pedia que a ajudássemos naquilo que fosse possível.
Se ela precisasse tecer meias de lã para vender às lojas da cidade na época do inverno, ela dava-nos pequenas tarefas que não exigissem grande habilidade, para que ela pudesse fazer as coisas mais difíceis, e assim, obter maior rendimento e produtividade.
Evidentemente, quase nunca recebíamos nada pelos nossos esforços, porque o dinheiro ganho com o trabalho de todos era destinado para o pagamento das despesas da família como um todo, e quase nunca sobrava nada para se distribuir para as crianças como forma de recompensa pessoal pelo esforço dispendido.
Mas, de alguma forma, sabíamos que o dinheiro ganho servia para pagar coisas que nós mesmos consumíamos. O fato de não receber nenhum benefício pessoal em forma de notas ou moedas era doloroso, mas eu aceitava o trabalho como uma forma de contribuição por ter o que comer em casa. Nunca negaram que fizéssemos compras no comércio local usando o crédito que meus pais tinham. Eu sabia disso, e trabalhar sem receber era o preço que tínhamos de pagar para obter esse crédito. O que eu não recebia pessoalmente ia para pagar as contas nesses estabelecimentos generosos, e por isso, eu não me rebelava com essa forma de trabalho.
Minha mãe então começou a perceber que crianças são imediatistas, e que não estão dispostas a trabalhar sem ver o resultado prático de seus esforços revertido em forma de dinheiro vivo. Crianças não entendem o conceito de crédito.
Ao menos meus irmãos não entenderam, ou fingiam não entender, porque logo não queriam mais ajudar nessas pequenas tarefas rotineiras e enfadonhas que tínhamos de fazer.
Minha mãe resolveu usar uma técnica nova: passou a nos pagar pequenas quantias por determinados serviços prestados. Lembro-me, apenas como exemplo, que ela estaria disposta a pagar cinquenta centavos do dinheiro da época, o Cruzeiro, por volta de 1981, para que lavássemos toda a louça da pia, ou então realizássemos algum outro serviço doméstico qualquer que poupasse seu tempo e sua energia, de forma a nos estimular a trabalhar sistematicamente, para que juntássemos dinheiro, e ela tivesse tempo livre para fazer coisas que pudessem render algum dinheiro para a família, como montar flores de pano e arame, ou cuidar de hortas, ou bordar, ou fazer bolos ou tocas ou luvas para os motoqueiros da cidade.
Eu então aceitei a ideia de trabalhar para minha própria mãe. Meus irmãos não gostaram da ideia e não entraram no trabalho.
Em pouco tempo eu tinha enchido um cofrinho de moedas ganhas com meu próprio esforço, ainda que pagas pela minha própria mãe, o que significava que não nos tornamos mais ricos nem mais pobres com o processo, mas, de qualquer maneira, eu trabalhei diligente e sistematicamente por muitos dias em troca de cada moeda recebida.
Por fim, um dia alguém achou o esconderijo de meu cofre e o esvaziou.
Não sei quem foi, mas chorei copiosamente diante de meu segundo revém diante da tragédia do roubo.
Novamente, não ficamos mais pobres com isso, porque certamente foi alguém da família que ficou com as moedas, e usou o dinheiro de forma que bem entendeu, e a riqueza continuou na família.
Apenas meu trabalho foi em vão, de meu ponto de vista pessoal.
O roubo fez, e ainda faz, o mundo girar.
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