quinta-feira, 29 de novembro de 2012

As visitas a este blog

Somente para registro, comemoro e agradeço o fato de que neste mês de novembro, este singelo blog recebeu, pela primeira vez em seus longos anos de existência, um número considerável de visitas. O contador do próprio Blogger registra até agora, até este presente momento, mais de 500 visitas.

Certo, eu sei que muitas destas visitas são resultado de sites com robots que fazem visitas automatizadas nas quais ninguém lê nada, e achamos que estamos recebendo algum curioso estrangeiro, geralmente da Rússia, Alemanha ou Estados Unidos.

Mas mesmo assim, eu sei que a maioria das visitas são de leitores de verdade.

Fico feliz que seja assim.

Torço, e me esforçarei, para que este número continue crescendo.

O dilema do blogueiro

Tenho enfrentado um dilema ultimamente, com relação à maneira como ando administrando as coisas neste meu blog. Acredito também que muitos outros blogueiros que, como eu, gostam de escrever frequentemente, enfrentam o mesmo dilema.

A questão é a seguinte: eu tenho muito o que escrever, mas ao mesmo tempo tenho uma baixa audiência em meu blog. Tenho então duas opções: ou escrevo pouco, e faço alguma divulgação do blog em algum canal qualquer, para que eu tenha o prazer de ver as pessoas entrando no blog e lendo as postagens, comentando e incrementando os contadores de visitas das mesmas, ou escrevo muito, aumento sensivelmente o número de postagens que compõem o meu blog, porque não podemos ser insensatos e escrever postagens imensas, e em consequência, ainda que continuemos fazendo publicidade, veremos os números dos contadores se diluírem, com postagens sem visita alguma, para nossa tristeza e desapontamento.

Se escrevo pouco, um possível fã ficará decepcionado de entrar em meu blog e ver as mesmas postagens de uma semana atrás, com muitos comentários e muitas visitas, mas já sem nenhum atrativo, e então não voltará. Se publico um número grande de postagens, as pessoas que gostam de ler meu blog poderão incrementar as visitas, mas mesmo assim, eu me sentirei desanimado, porque haverá postagens que eu considerarei boas, nas quais despendi muito esforço e tempo, mas que nunca foram lidas por ninguém.

Ou escrevo muito para quase ninguém, ou fico com o desejo de escrever reprimido.

No fundo, acho que as pessoas não gostam muito de ler.

No fundo, acho que tudo é uma questão de arrogância e vaidade, minha e de quem lê blogs apenas para receber uma visita de volta.

Mas, apesar disto, acho que tenho mais a ganhar escrevendo muito que pouco.

Meus leitores, reais ou potenciais, também.

Difícil, este dilema, de blogueiros indecisos.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Precondições

Todas as vezes em que penso em fazer algo produtivo, surge uma precondição.

O que é uma precondição? 

É uma exigência prévia da qual não podemos abrir mão, e sem a qual não podemos prosseguir (e se escreve junto mesmo, e não assim, "pré-condição", conforme o Dicionário Aulete).

Então, eu saio em busca de suprir esta precondição. Em geral, leio algo, faço algo ou me preparo para algo, na suposição de que assim, depois de um certo esforço, eu poderia fazer aquilo que originalmente me propus.

Mas a precondição, ela também, exige uma ou mais precondições.

Eu, espertamente, tentei várias vezes seguir adiante mesmo não tendo dominado as precondições, mas então, de repente, vejo-me embrenhado em um ponto a partir do qual não consigo seguir em frente, porque não sei do que se trata. Surge um termo, uma fórmula, uma referência que é um obstáculo intransponível, e do qual não consigo me desvincilhar. É a barreira da precondição. Eles, os autores, não mentem quanto a isto, posso afirmar com toda segurança. Então, não insisto mais: se leio sobre uma precondição, paro e vou atrás dela, se não a domino. E assim, tenho um monte de coisas começadas, mas interrompidas. E isto me exaspera, me imobiliza e me desanima fortemente. E eu não sei como me livrar disto ainda.

Se eu decido aprimorar meu site, escolho antes estudar um pouco de web design, por exemplo, para não perder tempo fazendo algo que não terá valor ou qualidade alguma. 

Então, mal começo a ler sobre web design e alguém, seja o autor de algum site, ou de algum livro, logo dirá, depois de alguns parágrafos introdutórios: para se seguir adiante, supõe-se um conhecimento mínimo, médio ou avançado em alguma outra coisa, tal como html ou artes plásticas.

Pronto. Ponho o site ou o livro de web design de lado e vou atrás de sites ou livros sobre html.

Mas o livro de html impõe também suas precondições: saber alguma coisa ou muito sobre programação, ou coisa do tipo.

Então, vou aos livros de introdução à programação, que pede um conhecimento de lógica como precondição. 

Vou estudar lógica e o livro pede um conhecimento de filosofia ou matemática como precondição.

Vou estudar matemática, um mundo vasto e complexo, e qualquer livro pede algo como precondição para qualquer coisa. 

E de repente, eu me pego lendo livros didáticos do segundo grau, ou mesmo do primeiro grau, procurando as bases de um conhecimento que aprendi formalmente a muito, muito tempo atrás, e que até então parecia enterrado no passado, mas que agora é fundamental.

Coisas que aprendi nos primeiros anos de escola. Coisas do segundo grau, que deveriam ser ensinadas, mas não formam, porque o professor de química gostava mais de ficar fazendo piadinhas na sala de aula do que propriamente ensinando algo. E assim por diante.

Eu poderia tentar algo simples, que não exigisse precondições, mas não é nada fácil. Não quero fazer algo e imaginar que estou me enganando, fingindo que sei algo sem saber de fato. 

Na vida profissional, podemos até enganar um grande número de pessoas a respeito daquilo que sabemos, aparentando saber mais do que sabemos de fato. Mas não posso enganar a mim mesmo, e não consigo satisfazer minha própria curiosidade. 

Assim, ando enredado em livros de história antiga, história moderna, história da ciência e de suas diversas ramificações, livros de introdução disto e daquilo, e neste meio tempo, acabo dispersando esforços lendo ou fazendo coisas que não preciso fazer, porque nem tudo do que leio eu preciso necessariamente aprender. Muita coisa eu já sei, mas tenho de ler para chegar aonde não sei, e assim, vou repetindo meu primeiro grau, meu segundo grau, meus anos de faculdade e mais outros anos ainda de estudos fora das escolas.

Acho que nunca irei parar de estudar e fazer algo concreto no mundo real.

As precondições não permitem.

domingo, 25 de novembro de 2012

País do futuro?

É preciso ser realista com a vida na medida em que se vai envelhecendo. Muitas das aspirações juvenis desvanecem-se ao longo dos anos, e as esperanças de um futuro melhor, ao menos aqui, no Brasil, vão minguando dia a dia, para nós que já vivemos bastante, e estamos envelhecendo.

Eu disse certa vez neste blog:

"Fui registrar ocorrência na delegacia de polícia de plantão, e, pensando no que significa tudo isso a longo prazo, perdi a esperança no Brasil.

Para dizer a verdade, nunca acreditei um segundo sequer nessa ladainha que venho ouvindo desde que tenho seis anos de idade, a de que o Brasil é o país do futuro. O Brasil, agora tenho certeza, foi, é, e sempre será, um fracasso. O último que sair que apague a luz."

Esta frase é triste e amarga. Para as pessoas que amam este país, e anda não viveram o suficiente para perder parte da esperança, ela soa como uma declaração maldosa e fria.

Mas não estamos falando de torcer pelo país da mesma maneira que torcemos por um time de futebol. O Brasil, ao contrário do que muitos pensam, não é apenas a Seleção Brasileira de Futebol.

As pessoas tendem a depositar esperanças no país da mesma maneira que depositam esperança na Seleção para a próxima Copa. Há uma sensação de que tudo depende de um pouco de garra, fé, esperança e uma equipe entrosada de astros jogadores. Mas a vida real não é bem assim.

Um país tão grande e com tanta gente diferente, com valores diferentes e culturas diferentes não muda de um dia para outro. Ele nem muda de uma década para outra, apesar dos carros novos que circulam nas ruas dando a impressão de modernidade, nem muda em função de um mendigo circular pelas ruas com um iPhone novinho em folha.

Também não se pode confundir o Brasil com as imagens que o Governo publica nos intervalos dos programas de televisão, que sempre mostram as mesmas coisas: plataformas de petróleo, grandes rodovias, os aviões da Embraer e dezenas de colheitadeiras ceifando em conjunto aquele mar de soja em alguma planície longínqua no interior do Mato Grosso. As pessoas se empolgam com imagens assim, e acreditam realmente que o Brasil é um país muito rico e moderno, e se enchem de orgulho ufanista, como se tudo estivesse indo muito bem, graças à garra do povo brasileiro, que não desiste nunca.

A afirmação acima é amarga. Não tenho bola de cristal para saber como será o futuro, mas tenho livros de história que mostram o passado de maneira fria e isenta. Esses livros deixam claro que países são apenas frutos de seus povos, e nada mais. Não há país sem povo, e não há país moderno com povo atrasado, assim como não há povo moderno em país atrasado. O país é sempre a soma do povo, por mais que digam o contrário.

Na medida em que uma geração envelhece, passa a ver um limite temporal pela frente. As pessoas começam a fazer contas a respeito do tempo que falta para se aposentarem, e sabem que a partir de uma certa idade, não resta mais tanto tempo para se apostar no país. Pode haver amor pelo país, mas há o amor próprio que cada um tem por si, e que se sobrepõe ao amor pela pátria. As pessoas ainda torcem pelo país, mas se puderem, darão um jeito de procurar lugares melhores para passar os poucos anos que restam de vida.

E assim, aos poucos, os brasileiros que podem vão indo embora do país.

É curioso observar que sempre que ocorre uma tragédia qualquer em algum lugar do mundo, seja onde for, sempre há um brasileiro envolvido. Geralmente algum deles se encontra entre as possíveis vítimas de alguma desgraça mundo afora.

Isto é o sinal de que há uma diáspora silenciosa em curso, e que poucos admitem.

É feio falar mal do próprio país. É ofensivo. As pessoas não admitem que outras pessoas não gostem do próprio país. Elas relutam em aceitar que há países melhores no mundo. Mas a verdade é que o mundo é vasto, e na medida em que mais e mais gente viaja mundo afora por turismo ou negócios, vai se percebendo que há, sim, muitos lugares melhores no mundo em diferentes aspectos.

A crítica que fiz foi com relação à segurança. Acho que é uma crítica justa. Acredito que um país inseguro como o Brasil não é um lugar bom para se viver. Quando mais velhos ficamos, mais nos sentimos vulneráveis à violência generalizada que destroça nosso país. E há, sim, uma grande maioria de países mais seguros para se viver que o Brasil. Nossas tristes estatísticas não incentivam ninguém a viver aqui. Nem mesmo a vir passear aqui, meramente a turismo. Por que correr o risco de ser assaltado no Brasil se posso visitar o Caribe com suas belas praias com total segurança?

Mas o problema da segurança é um problema insolúvel, crônico, que não depende de nossas atitudes a favor ou contra nada. É um problema que se expande a cada dia e que nos trás desesperança e tristeza. E é um problema gerado por brasileiros, alimentado por brasileiros, fomentado por brasileiros, defendido por brasileiros e alvo de lucro de brasileiros. Há um grupo de brasileiros que tem total interesse neste estado de coisas, e mais se beneficiarão quanto pior se tornar a situação. Quanto pior se tornar o país, mais benefícios esse grupo de brasileiros terão. E eles não vão desistir de seus ganhos. E assim, nós, demais cidadãos, perdemos já, definitivamente, o jogo contra a violência.

Se você acha que o problema da violência vai ser resolvido, reveja suas opiniões. O problema vai piorar. Não vou explicar agora as razões deste pessimismo, mas ele não é sem razão, ou sem motivos. Há razões institucionais, estruturais, ideológicas e corporativas para que a violência se amplie. A ameaça vem de dentro do sistema em que vivemos, e não de fora, ou do momento, ou de mera circunstância.

Eu não estou sendo ameaçado por americanos, chineses, russos ou argentinos. Eu estou sendo ameaçado pelos meus próprios conterrâneos. Não podemos confiar em nossos próprios vizinhos, nem em nossos porteiros, nem em nossas empregadas domésticas, nem em ninguém. Todo cidadão tem razões de sobra para temer qualquer um e todos.

A violência está matando o futuro de nossa sociedade. Como nada é feito, e a coisa só tem piorado, a melhor coisa a se fazer é acautelar-se. Mais dia, menos dia, as pessoas vão se aposentar e dar adeus ao país.

Vão-se, para nunca mais voltar. Partirão ameaçados de sua terra natal ingrata para morrer em uma terra estrangeira qualquer mais segura, anônimos, é verdade, mas em paz.

Os bandidos, assim, expulsarão os bons, e no final teremos algo como aquelas ilhas desertas, onde só habitam cobras peçonhentas, que depois de devorarem tudo, devoram-se umas às outras.

Esse é o nosso país do futuro?

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Siku, parabéns!

Siku


Siku, o ursinho polar rejeitado pela mãe e criado pelo adorável pessoal do Scandinavian Wildlife Direpark, em Kolind, na Dinamarca, completa hoje 1 aninho. 

Agora, ele já está grande e pesa mais de 100 kg. Você pode vê-lo ao vivo diariamente no site Explore.org, andando calmamente pelo gramado, roendo uma perna de carneiro, nadando, dormindo, sentado ou em pé, tentando ver o que ocorre à sua volta, como os ursos em geral fazem.

Siku é o pequeno Embaixador dos ursos polares selvagens, que vivem no Pólo Norte, e que sofrem com o derretimento da calota de gelo do Oceano Ártico, que neste verão nórdico atingiu seu menor tamanho desde que este vem sendo monitorado. Com o derretimento do gelo, os ursos polares precisam nadar mais em busca de alimento, e os filhotes, mais frágeis, tendem a morrer.

Assim, em um esforço global na busca de se tentar reduzir as emissões de carbono pela ação humana, Siku representa os ursos polares de todo o mundo selvagem. Em nome de todos os ursos, nos é pedido que reduzamos nossas emissões de carbono, que colaboremos de todas as formas possíveis para que o aquecimento global não se agrave, ou se detenha, ou ainda, quem sabe, reverta-se de alguma forma.

Esta mensagem é em razão disto. E nós precisamos pensar melhor neste assunto aparentemente tão triste e remoto.

Siku está bem tratado, saudável e, esperamos, viverá longos anos ainda. 

Não sei dizer quando aos demais ursos polares selvagens. Eles já não são muitos, e estão ameaçados. 

Eu sei que há muitas espécies ameaçadas, e eu sinto muito por elas, por todas. Eu sinto muito que não seja possível dar a mesma evidência que é dada a Siku. Nem todos os animais são tão cativantes quanto um fofinho urso polar. Mas não é somente pela fofura de Siku que devemos nos comover, e temer pelo pior. Não são somente ursinhos fofinhos que correm risco. O que dizer dos animais que não são afortunadamente belos? O que dizer dos animais que não são vistos pela internet mundo afora, em países pobres e remotos?

O que é preciso se enfatizar aqui é que Siku representa todas as espécies que, por ação humana, ou mesmo por ação da natureza, correm risco de extinção.

Eu sei também que há miséria no mundo suficiente para nos preocupar pelos próximos milênios, mas um problema não significa o fim de outro. A miséria humana não minimiza a catástrofe ambiental que direta ou indiretamente estamos provocando.

Siku está vivo, e as pessoas cuidarão dele. Ele é uma feliz exceção. Mas, e quanto ao resto? 

Como brasileiro, sei que muitos dirão que deveríamos nos preocupar com nossos animais, e não com animais de outros países, outros continentes, outras regiões do planeta. Mas eu digo que a vida é a mesma, seja ela representada por um urso, um lobo guará, um panda ou um pinguim. Se fosse possível, todos os animais deveriam ter seus nomes inclusos na lista de Embaixadores da Vida, tal como Siku. Ocorre apenas que os dinamarqueses, povo educado e com recursos suficientes para tal, tomaram a excelente iniciativa de mostrar ao mundo o que é um urso polar, e o risco que eles correm, fazendo as imagens de Siku rodarem o mundo.

Talvez não possamos deter o aquecimento global. Talvez nem haja de fato um processo de aquecimento global, mas é certo que podemos fazer muito pela nossa preservação e pela preservação da fauna e flora ameaçadas pela nossa existência descontrolada.

Aceite esta ideia: nossa presença no planeta representa uma ameaça a outras formas de vida. Se destruirmos estas formas de vida, estamos destruindo a nós mesmos, como espécie. Não é que a miséria humana seja um problema e a extinção dos animais seja outro tipo de problema. Eles são o mesmo problema, visto de ângulos diferentes.

Somos uma espécie predatória.

Siku é um predador, mas em relação a nós, é uma simples e frágil vítima.

Precisamos urgentemente repensar nosso modo de vida como espécie.

Nós precisamos enfrentar este problema: nós mesmos.

Obrigado, pessoal do Direpark.

Parabéns, Siku!

Abra o olho, ser humano!

Siku

sábado, 17 de novembro de 2012

A ferida mais lambida

Eu disse aqui sobre algo que me aconteceu, e muito me aborreceu:

"Mas nem tudo foram sonhos nesses últimos dias. No sábado à noite, a vida real mostrou um pouco do seu lado pesadelo. Enquanto eu passeava por entre a multidão de mulheres na famosa Feira da Lua de Goiânia, alguém muito esperto enfiou a mão na minha mochila e roubou minha carteira, com tudo. Documentos, todos, dinheiro, etc. Fui registrar ocorrência na delegacia de polícia de plantão, e, pensando no que significa tudo isso a longo prazo, perdi a esperança no Brasil."

E eu tinha razão: façam as contas. Morre-se e mata-se mais aqui, no Brasil nestes últimos meses, do que em campos de guerra como Síria, Afeganistão, Iraque, Palestina e outros lugares ruins mundo afora. Superamos  os mexicanos como povo que mais sofre com o crime organizado e desorganizado. Sofremos a nossa guerra civil silenciosa.

Mas esta é a nossa ferida mais lambida.

Um bandido, para uns, é um ser deturpado. Merece o isolamento, porque é uma espécie de aberração humana, que não sabe, e portanto não pode, viver em sociedade, porque é um perigo para todos. 

Para outros, ele é apenas um negociante. Ele só quer dinheiro, e usa o caminho mais rápido e arriscado. Ele toma à força, e corre o risco de ser pego e preso. Se não for, e quase sempre não é, então, ele dispõe de um negócio tão legítimo como qualquer outro, e prospera. 

E para outros ainda, um bandido é um inocente, que rouba porque é oprimido, e tem fome, e luta contra um poder maldito, e portanto, não é um vilão, mas um herói social. Um Robin Wood.

Para mim, ele é uma ameaça, e sei que, não importa o que as diferentes correntes de opiniões acham, um bandido é somente isto: uma ameaça à minha vida. Ele é como aquelas bombas enterradas, lançadas nas guerras, mas que não explodiram. Você vai no jardim de sua casa, faz um buraco na terra e lá está ela, a bomba. Ou uma mina terrestre. Não falemos nas cobras. Elas são apenas animais inocentes que não existem mais.

Um bandido é uma arma apontada para você, sem controle e imprevisível. Ele o mata sem pestanejar. Ele mata sua esposa. Ele mata seu filho. Ele mata seu bebezinho em seu colo. Ele arrasta seu bebê pelas ruas como a um cão morto. 

Ele não ama você.

Então, essa ferida social, aberta, fétida e purulenta, dói em todos. 

Lamba-a, se quiser. Você será mais um alvo, não importa o quanto a cuide.

Você não é amado pelo crime.

Lamba, mas saiba disto.

Vales de lágrimas

Eu disse aqui que sonhei um sonho estranho:

"Sonhei também com os barrancos do abismo, e ele era escorregadio. Mas nós os vencemos, eu e meu rotweiller, o Schubert, Bom Cachorro! E além, um pântano africano leitoso e seu palácio inacabado."

Este sonho é simples de se explicar.

Pegue seu computador, entre no Google Earth, vá até Lagos, na Nigéria, e navegue pelas fotos por uma hora pacientemente. Pense em pântanos africanos, leitosos, com palácios inacabados. Eles não existem apenas nos nossos sonhos. Eles existem por todo este vasto mundo corrupto e decadente.

Lagos, Nigéria, oito milhões de habitantes. E crescendo, sem parar.

Este é um dos lugares que fazem deste pobre planeta um vale de lágrimas.

Outro lugar é o Brasil.

Hoje, não sei nada sobre meu ex-cachorro Schubert. Tive de doá-lo, porque não poderia mais viver naquele maldito bairro goianiense onde vivíamos. O crime, este que é uma das nossas chagas mais lambidas, obrigou-me a mudar para um bairro aparentemente mais seguro e limpo. 

Nesta postagem de 2004, eu iria lamentar amargamente a falta de futuro para este Brasil, e não poderia saber que a causa de minha ira não era nem sombra do que aconteceria alguns meses mais tarde, e que me obrigaria a mudar-me, e a doar Schubert, meu bom cachorro.

Agora, estamos bem pior que em 2004.

As coisas mudaram.

Para pior.

Explorando tragédias

Eu disse aqui que tive um sonho surpreendente:

"E sonhei também com um parque temático americano. Sim, sonhei com o Parque Temático do 11 de Setembro. Acreditem se quiserem."

E é surpreendente que ele ainda não exista.

O capitalismo adora explorar desgraças. Ele vê nas tragédias uma excelente maneira de ganhar dinheiro. O episódio trágico de 11 de Setembro de 2001 não está superado. Ele ainda dói em todos. Assim, é ainda possível se fazer algum dinheiro com ele.

Mas, um parque temático?

Sim, foi um sonho cínico.

Mas o cinismo capitalista também é assim, como um pesadelo: ele não respeita nada. Ele brinca com a sua dor, ele zomba de sua fraqueza, ele sente prazer em vê-lo em sua sordidez humana.

Eu, ainda assim, consigo ver coisas boas no sistema. Ele não é a solução, mas possui alguns méritos.

Pior que explorar 11 de Setembro por meio de um parque temático é ter provocado o episódio em si. E ele não foi obra capitalista.

É deplorável explorar tragédias, mas ainda mais deplorável planejar tragédias.

Este mundo é um vale de lágrimas.

Sonhos futuristas

Eu comentei aqui sobre um sonho futurista que tive uma noite dessas, em 2004:

"Tive um sonho muito doido. Sonhei com um mundo futuro, a mil, dois mil anos a frente do nosso mundo atual. Sim, mas nada de tecnologias óbvias. Aliás, de um modo geral, tudo até muito parecido com o nosso mundo de 2004, exceto por algumas coisinhas, como, digamos, as balas e chicletes da criançada, ou as canetas dos policiais dos parques, ou mesmo a maneira como a garotada controlava a bola numa pelada de futebol. Tudo muito, muito bizarro e louco."

Eu gosto de imaginar como será o futuro da humanidade.

Às vezes, esta curiosidade se manifesta em forma de sonhos. Sonhos futuristas não são necessariamente sonhos premonitórios. São apenas maquinações que nossos cérebros fazem com base naquilo que andamos pensando muito. São como aqueles sonhos desagradáveis que temos depois de estudar muito para uma prova de matemática. Sonhamos a noite toda com números sem sentido, equações que não entendemos e números e mais números sem sentido, numa espécie de pesadelo sem monstros.

A ficção científica leva esse assunto mais a sério. Tanto a ficção em forma de literatura quanto a ficção cinematográfica exploram possibilidades a médio e longo prazos para a humanidade.

Certo, eu até gosto de ficção científica, mas uma das razões para eu ter tido algum interesse pelo futuro foi o estudo da Administração. Claro, eu já disse aqui neste blog que nosso futuro pode depender de nosso passado, e que precisamos de algum tipo de exercício de imaginação para traçarmos um futuro pessoal, de como e onde gostaríamos de estar nos próximos anos ou, quando muito, em décadas, mas esta forma de imaginação não é bem um exercício de ficção científica, nem possui método algum.

Em Administração, há algo como técnicas e métodos de se tentar ver ou moldar o futuro de forma racional e organizada. Seria uma espécie de ciência: a Futurologia.

Mas sonhos futuristas não são obras da Futurologia. Nem planos pessoais. São romances de ficção científica que criamos sem querer.

De qualquer forma, esses sonhos são a prova de que gosto tanto do presente quanto do passado e do futuro.

Gosto do futuro.

Espero um bom futuro.

Trabalho por um bom futuro.

Aviões, mortes e o mau

Eu também disse aqui mais alguma coisa sobre aviões: 

"Mas show mesmo no céu foi a passagem por sobre Goiânia, numa tarde nublada dessas, de uma esquadrilha de oito caças da FAB. Uma formação em V, com cinco AMX na parte interna e dois Mirage nas laterais. Um terceiro Mirage, vários quilômetros mais atrás, retardatário, acelerando quase que a ponto de quebrar a barreira do som buscando alcançar os demais. Um show! Passaram e se foram em poucos segundos."

Eu já fui um sargento da Força Aérea Brasileira.

Acho que aqueles pontinhos em forma de grãos de arroz fascinaram-me de tal maneira que eu acabei querendo ser piloto. Não pude ser piloto militar, mas mesmo assim, achei que seria uma opção ser militar na Força Aérea. Com o tempo, a opção mostrou-se errada. Eu deixei a vida militar em 1995. Em 2004, quando postei o comentário acima, eu morava em Goiânia. Mas eu servi como sargento em Anápolis, a apenas cinquenta quilômetros de Goiânia. Eu conhecia bem aqueles aviões.

Hoje, não sei o que dizer sobre aviões militares.

Claro, são máquinas fantásticas, lindas e poderosas, mas estão a serviço de quê?

Eu amadureci, e sei mais hoje do que sabia quando era adolescente e decidi seguir a carreira militar. Sei que estas máquinas existem para matar.

Elas estão matando agora, neste exato momento em que estou teclando essas palavras. Israel está certamente com poderosos caças armados bombardeando a Faixa de Gaza, hoje, agora, não há dúvidas. E a imagem de um bebê de dez meses embrulhado em um lençol, filho de um jornalista da BBC, rodou o mundo, numa demonstração de dor e pesar, demonstrando claramente para todo o planeta o que esses belos equipamentos são capazes de fazer.

Mas eu sei também que aviões são apenas isto: máquinas nas mãos de homens. Por trás de um bebê morto há pessoas com ideias. Este pobre bebê não foi morto por um F-16 com um míssil guiado a laser. Ele foi morto muito antes, pelas ideias que dominam o mundo a séculos, milênios, como demônios aos quais não podemos ver, nem controlar, nem fugir.

Estes demônios rondam o mundo, e eles rondam a minha casa. Rondam a nossas casas.

Aviões militares são apenas isto: a materialização do mau.

São demônios que não podemos ver. Mas eu tenho certeza de que, apesar disto, nós podemos vencê-los.

Aviões cruzando os céus

Eu disse aqui sobre minha paixão por aviões:

"Tenho que relatar minha paixão por aviões. Nesses meses de frio, o céu no Centro-Oeste é quase sempre limpo como um cristal. E como o ar da alta atmosfera está sempre muito frio, vez por outra posso ver o rastro de condensação atmosférica deixado pela passagem de algum avião muito, muito ao longe. É simplesmente fantástico. Não se vê nada, a não ser um risco muito, muito longe. A quantos quilômetros está esse avião de onde estou? Cinqüenta, cem quilômetros? Um show."

Continuo achando os aviões máquinas fantásticas, lindas e encantadoras.

Se pensarmos em termos históricos, é uma dádiva contar com eles. Você entra dentro de um deles, um tubo de metal enorme, pesado, complexo, e esta coisa corre pela pista mais rápido que um carro de Fórmula 1 em poucos segundos e logo está no ar. E não para. Ele sobe, sobe e sobe e acelera, acelera e acelera, até que quando estamos começando a nos acostumar com ele, com o seu interior, com a viagem em si, pronto, já estamos descendo, pousando num tranco suave e descendo num lugar muito, muito distante de onde partimos.

Sempre que vejo um pontinho no céu, sei que lá dentro vão centenas de pessoas seguras, embora que com um pouquinho de medo desta máquina misteriosa e estranha.

Esta máquina que, embora comum, é nova.

Vi os primeiros riscos no céu ainda muito pequeno, no começo da década de 1970. Naquela época, já existiam aviões comerciais grandes cruzando o céu, mas eles eram uma novidade. Os primeiros grandes aviões comerciais a jato surgiram uma ou duas décadas antes. Os primeiros rastros de aviões observados surgiram provavelmente na Segunda Guerra Mundial, com aviões a hélices. Assim, esses riscos nos céus não eram coisas comuns no Brasil nos primeiros anos da década de 1970. Até mesmo os adultos se impressionavam com eles.

Nem sempre os aviões produzem rastros no céu. Mas eles sempre produzem algum barulho.

Quando eu era um pouco mais que um bebê, meu pai apontava para o céu e procurava pela origem do som das turbinas rugindo muito alto em algum lugar lá em cima. Depois, apontava com o dedo e dizia; "olha lá!"

E eu não via nada. Nem ouvia nada, que eu me lembre agora.

Mas eu olhava.

Nas primeiras vezes, não vi nada, mas depois, um dia, eu vi.

Um pontinho muito, muito pequenino.

Não era como uma mosca, que é pequenina, mas está perto. Nem era como uma estrela, que brilha pequenina, parada, no escuro. Era como um grãozinho de arroz perdido no nada.

Quando aviões estão muito altos e são cobertos com pintura branca, às vezes não vemos as asas, porque elas se confundem com o azul do céu no fundo. E era isto que eu via: somente o corpo dos aviões, como pequenos grãos de arroz seguindo em linha reta, até sumirem por trás de nuvens, ou sumirem na nada, misturando-se com o azul e desaparecendo.

Esses pontinhos nos céus sempre me fascinaram.

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Bugigangas não confiáveis

A marca é famosa: GE. Só por isto, deveria ser um produto bom, mas não é. Agora, neste exato momento, minha máquina de lavar está com as roupas todas limpas em seu interior, mas a porta está travada. A maquina funciona, mas não abre a tampa e não libera as roupas.

Isto é patético. Vindo de um produto banal, uma porcaria de uma máquina de lavar roupas, deveria surpreender. O que há de tão sofisticado em uma tampa que possa dar errado de alguma forma e não possa abrir e liberar a porcaria da roupa? 

Mas não me surpreendo. 

Este não é o primeiro problema desta máquina. Elas sempre dão problema. Sempre.

Na verdade, elas são fabricadas intencionalmente para dar problemas. Se não fosse assim, como uma empresa de fundo de quintal poderia se transformar no curto período de um século numa GE? A GE é uma das maiores empresas do mundo. Ela supera, com seu faturamento de bilhões e bilhões de dólares anuais, o PIB de muitos países. Ela é um colosso, vendendo suas máquinas cuidadosamente planejadas para dar defeito de tempos em tempos, num processo mundialmente conhecido com obsolescência planejada.

Eu só posso pensar assim. Não posso pensar diferente.

A GE fabrica também turbinas de aviões.

Imagine se ela fosse depender apenas do faturamento das turbinas, que, ao contrário das máquinas de lavar, são muitíssimo mais sofisticadas, e não podem falhar nunca, de forma alguma, sob risco de levar a GE à falência se meia duzia delas pifarem ao mesmo tempo.

Mas elas, as turbinas, não falham. Elas funcionam milhões de horas seguidas levando bilhões e bilhões de passageiros são e salvos para todo canto do mundo. E a GE sabe disto. Ela não pode fabricar turbinas com falhas. E não fabrica.

Assim, nós, donos de máquinas de lavar roupas, pagamos a conta dos passageiros de avião.

Este é o capitalismo.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

República

Neste feriado de 15 de novembro de 2012, completamos 123 anos de República no Brasil. O que isto significa? O que temos realmente de importante a comemorar? O que é República, afinal de contas?

Na cabeça das pessoas, a Proclamação da República foi aquele dia em que o Marechal Deodoro deu um golpe militar no governo de Dom Pedro II, aquele acontecimento antigo que se deu em algum quartel do Rio de Janeiro, um evento entre dois barbudos sisudos e antiquados e que lutaram entre si por um não sei o quê de poder, mas que hoje só é um dia importante porque é um feriado, e nele as pessoas podem ir à praia, viajar para a roça ou para as montanhas, e isto é bom, muito bom, porque trabalhar cansa, e o que elas querem mais é descansar.

O que é República?

Claro, a Wikipédia trás um bom relato da Proclamação da República aqui, mas o Brasil não foi o primeiro país republicano. Esta ideia, a de República, é uma ideia antiga. A experiência também. Mais uma vez, a Wikipédia dá uma explicação do que seja república aqui.

Uma República com 123 anos de permanência é razão para se comemorar?

Talvez não. A República Romana durou 478 anos, entre 509 e 31 antes de Cristo. Precisamos ainda de 355 anos no futuro para igualarmos nossa República Brasileira à República Romana. No ano 2367, se ainda existirmos, poderemos dizer que nossa República é longeva, madura e permanente. Por enquanto, em termos históricos, nossa República é uma adolescente.

Mas, mais que isto: nossa República é mesmo uma República? O que dizer da ilusão que oculta ditaduras, conchavos e acordos nos quais a vontade dos cidadãos não significa nada? Somos mesmo uma República?

Por isto, nesta postagem eu disse:

"Mudando o assunto para a Política, tenho pensado que talvez a melhor coisa que poderia surgir da fusão da Web com a Política seria o fim do sistema representativo. Isso mesmo: cada cidadão vota por si mesmo, sem a figura do político profissional, corrupto, falso, traidor, traiçoeiro e não confiável. Isso seria a glória da Democracia. O assunto é longo e merece muita atenção."

Hoje, neste 15 de novembro de 2012, temos boas razões para esperar que no futuro, nos livremos desses intermediários indesejados. Se não, que ao menos tenhamos melhores políticos.

Curiosamente, neste dia, o grande herói é um anônimo, que dirigiu um ônibus em chamas em Florianópolis, poupando inocentes do risco que bandidos, políticos e cidadãos alienados causam a si mesmos, porque nossa República é falha, e continuará falha se nada for feito, se continuarmos achando que República é sinônimo de descanso, cerveja e tranquilidade.

Triste República, esta.

Sonhos premonitórios

Relatei aqui alguns sonhos premonitórios.

Será mesmo que nossos sonhos podem penetrar no futuro, ou tudo não passa de uma ilusão da qual não conseguimos nos desenredar, nem explicar satisfatória e definitivamente?

Eu tentei criar um blog que tratava deste e de outros assuntos parecidos, mas não fui adiante.

Estudar a possibilidade de se conhecer o futuro antecipadamente por meio dos sonhos é uma tarefa científica ou é uma tarefa religiosa, mística ou espiritual?

Acho que um acontecimento como um sonho premonitório, ou aparentemente premonitório, é algo perturbador, e, dependendo de quem tem uma experiência dessas, ele, o sonho, pode levar quem sonha a ver o mundo como um lugar sombrio, tenebroso, perigoso.

O misticismo que envolve um relato deste tipo é assustador. Você pode estar com o mais moderno dispositivo eletrônico em meio a pessoas bastante instruídas em algum lugar claro, iluminado, moderno e sofisticado, mas se ouvir alguém falando sobre um sonho esquisito que teve na última noite, você provavelmente sentirá alguma sensação que lembra medo, pavor, confusão e insegurança. Há algo neste tipo de relato que puxa de sob nossos pés toda a segurança que supostamente desfrutamos no nosso moderno mundo cientificamente avançado e próspero.

Hollywood explora bem essas experiências. Uma série de filmes sobre premonição sempre consegue um bom público e uma boa bilheteria.

Acontece que este tipo de experiência não é uma invenção de Hollywood, nem são apenas coisas criadas por cabeças atrasadas e caipiras.

Essas experiências são antigas, muito antigas, e elas já estavam em relatos bíblicos de mais de três mil anos atrás.

Parece que a espécie humana carrega consigo esta capacidade, a de sonhar e supor que determinados sonhos penetram em fatos futuros.

Por milênios esses sonhos tem sido tratados como uma espécie de poder do qual não sabemos as causas, nem temos controle, e ao qual atribuímos uma influência não humana. Algo, ou alguém, tem algum controle sobre esses sonhos, e este alguém não somos nós, meros sonhadores. 

A incerteza, a insegurança que esses sonhos trazem, assim como qualquer tipo de experiência tida como mística, espiritual ou sobrenatural, é irritantemente antiquada, pobre e alienadora.

Um dia, eu me irritei com a sensação de impotência que este misticismo trás, e busquei livrar-me dela.

Existe o sobrenatural?

Se existe, o que é?

Eu não admiti minha ignorância e o meu medo diante do assunto. Não mesmo.

Birdy

Eu disse aqui que andava ouvindo Creed e Evanescence.

Hoje, não ouço mais essas bandas. Não sinto vontade nenhuma de ouvir rock de qualquer tipo, exceto Bon Jovi.

Ontem, véspera de feriado, ouvimos aqui em casa, eu e minha esposa, Jamiroquai, velho, mas muito bom, e Birdy.

Quer saber o quê?

Jamiroquai, "Alright":




E Birdy, "Skinny Love".



É isso: nossos gostos mudam, sempre.

Três quadros na parede

Eu escrevi aqui:

"Três quadros na parede"

"O ano exato eu não sei. Foi provavelmente em 1980. Talvez um ou dois anos antes. Talvez um ou dois anos depois. É difícil precisar o dia exato de um acontecimento quando ele se dá de maneira casual, quase imperceptível. 

Por isso, não sei bem em que ano o fato que narro aconteceu.

Mas sei bem, passados trinta anos depois de ocorrido, da importância do fato.

Não importa. Eu era um garotinho, tinha uns dez anos de idade e morava com minha família na pequena Tujuguaba.

Tujuguaba, como veremos fartamente mais adiante, é uma pequena comunidade, um vilarejo, que fica bem próximo da pequena cidade de Conchal. Sempre foi assim.

Minha mãe era de Conchal. Meu pai, de Tujuguaba. Depois de casados, decidiram morar em Tujuguaba. Então, neste dia de 1980 (vamos aceitar que foi em 1980 mesmo, para deixar a história mais bonita), nós saímos de Tujuguaba e fomos a Conchal, visitar nossa avó Verginia, que ali morava.

Era um passeio como muitos outros. Íamos na casa da avó sempre. Era uma coisa natural e corriqueira.

E sempre era nos fins de semana. Um sábado, ou um domingo talvez.

E era sempre a mesma coisa. Chegávamos, meu pai ia para os bares da cidade e nós, o restante da família, ficávamos na casinha humilde de minha avó.

Eram quase sempre as mesmas conversas. O mesmo tipo de assunto. Os mesmos problemas. As mesmas lembranças.

Minha mãe, minha avó, minhas tias, os adultos em geral, falavam sobre o passado. Nós, crianças, ouvíamos, entediadas.

Havia razão para o tédio. Nós, as crianças, ouvíamos histórias de pessoas, lugares, coisas e épocas que não faziam nenhum sentido para nós. Quem era a Tia Tonica? E quem foi o tio Benedito? Não fazíamos a menor ideia, porque era tudo gente ou muito velha, ou já morta há muito tempo atrás.

Não sabíamos, e nem nos importávamos muito. Gostávamos mesmo somente das histórias de assombração e dos lobisomens.

Mas então, neste dia, neste dia em particular, de alguma forma o assunto transcorreu para um passado que me interessou. Algo em mim havia amadurecido e agora ao menos parte daquelas histórias antigas fazia algum sentido. 

Falavam sobre meu avô, já falecido. Pai de minha mãe. Esposo de minha avó. Vô Zé Indalécio. 

Minha avó viúva morava numa casa muito pequena e simples. Havia em uma das paredes três retratos velhos, amarronzados pelas décadas de poeira e tempo.

Nos dois quadros menores, idênticos em forma e moldura, havia um casal. Era formado pelo pai e pela mãe de meu avô. Minha avó falou sobre eles. 

No outro quadro, o maior, mais um casal. Este era formado pelos avós paternos de meu avô, pai de minha mãe. E minha avó falou sobre eles também.

Aquelas lembranças não se perderam no tempo. Estão comigo. 

Fascinam-me.

Elas precisam ser contadas.

Minha avó Verginia contou a história partindo do presente e retrocedeu até onde sabia no fundo do tempo.

No entanto, partindo do fundo do tempo eu a recontarei, no sentido cronológico habitual. 

Em um dos quadros na parede, meus bisavós. No outro, meus tataravôs. Em um dos quadros, um casal de velhos. Nos outros dois quadrinhos menores, mais um casal de velhos.

Por que esses quadros são tão importantes?

Eles são importantes porque eles contam a história de meus antepassados mais antigos. 

Um pouco de genealogia e matemática se faz necessário aqui.

Eu tenho dois pais. Logo, tenho quatro avôs. E em consequência, tenho oito bisavós. E se tudo correu bem, tenho dezesseis tataravôs.

Sei quem são meus pais. Sei quem são meus quatro avôs. Já não sei tudo sobre meus bisavós. Sei alguma coisa a respeito somente de seis deles, dentre os oito bisavós que necessariamente tive. Sobre dois deles nada sei. E dos dezesseis tataravôs, só sei alguma coisa sobre dois deles. São sobre esses dois que falo agora. Exatamente por serem os meus antepassados mais antigos é que começo por eles. 

Eles estão retratados em um daqueles quadros. Eles são aqueles dois velhos que vi em um daqueles três quadros pendurados na parede da sala de minha avó materna em 1980.

Sei que eles são meus tataravós porque minha avó assim o disse, com base em sua longa vida com meu avô, seu marido, neto daqueles dois velhos do quadro.

Eu poderia simplesmente repetir a história que minha avó contou naquele dia, mas prefiro contar as coisas a meu modo. E vou contá-la agora."

Pensando bem, eu poderia contar esta história exatamente da maneira que a minha avó contou.

Poderia.

Uma mensagem para Garcia

"Em todo este caso cubano, um homem se destaca no horizonte de minha memória. Quando irrompeu a guerra entre a Espanha e os Estados Unidos, o que importava aos americanos era comunicar-se, rapidamente, com o chefe dos insurretos - Garcia - que se sabia encontrar-se em uma fortaleza, no interior do sertão cubano, mas sem que se pudesse dizer, exatamente, onde. Era impossível um entendimento com ele pelo correio ou pelo telégrafo. No entanto, o Presidente precisava de sua colaboração, e isso o quanto antes. Que fazer? Alguém lembrou:

"Há um homem chamado Rowan... e se alguma pessoa é capaz de encontrar Garcia, há de ser Rowan”.

Rowan foi trazido à presença do Presidente, que lhe confiou uma carta com a incumbência de entregá-la a Garcia. De como esse homem - Rowan - tomou a carta, meteu-a num invólucro impermeável, amarrou-a ao peito e, após quatro dias, saltou de um barco sem coberta, alta noite, nas costas de Cuba; de como se embrenhou no sertão para, depois de três semanas, surgir do outro lado da ilha, tendo atravessado a pé um país hostil, e entregue a carta a Garcia, são coisas que não vêm ao caso narrar aqui. O ponto que desejo frisar é este: McKinley deu a Rowan uma carta destinada a Garcia; Rowan tomou-a e nem sequer perguntou: "Onde é que ele está?”.

Por Deus! Eis aí um homem cujo busto merecia ser fundido em bronze e sua estátua colocada em cada escola. Não é só de sabedoria livresca que a juventude precisa... Nem de instruções sobre isto ou aquilo. Precisa, sim, de um endurecimento das vértebras para poder mostrar-se altiva no exercício de um cargo; para atuar com diligência; para dar conta do recado; para, em suma, levar uma mensagem a Garcia.

O General Garcia já não é deste mundo, mas há outros Garcias. A nenhum homem que se tenha empenhado em levar avante uma empresa em que a ajuda de muitos se torne precisa tem sido poupados momentos de verdadeiro desespero ante a passividade de grande número de pessoas ante a inabilidade ou falta de disposição de concentrar a mente numa determinada tarefa... e fazê-la. A regra geral é: assistência regular, desatenção tola, indiferença irritante e trabalho malfeito.

Ninguém pode ser verdadeiramente bem-sucedido, salvo se lançar mão de todos os meios ao seu alcance, para obrigar outras pessoas a ajudá-lo, a não ser que Deus Onipotente, na sua grande misericórdia, faça um milagre enviando-lhe, como auxiliar, um anjo de luz. Leitor amigo, tu mesmo podes tirar a prova. Está sentado no teu escritório, rodeado de meia dúzia de empregados. Pois bem, chama um deles e pede-lhe: "Queira ter a bondade de consultar a enciclopédia e de fazer a descrição resumida da vida de Corrégio".

Dar-se-á o caso de o empregado dizer, calmamente: - "Sim, senhor" e executar o que lhe pediste? Nada disso! Olhar-te-á admirado para fazer uma ou algumas das seguintes perguntas:

- Quem é Corrégio?
- Que enciclopédia?
- Onde está a enciclopédia?
- Fui eu contratado para fazer isso?
- O senhor não quer dizer Bismarck?
- E se Carlos o fizesse?
- Esse sujeito já morreu?
- Precisa disso com urgência?
- Não sou melhor eu trazer o livro para o Senhor procurar?
- Para que quer saber isso?

Eu aposto dez contra um que, depois de haveres respondido a tais perguntas e explicado a maneira de procurar os dados pedidos, e a razão por que deles precisas, teu empregado irá pedir a um companheiro que o ajude a encontrar Corrégio e depois voltará para te dizer que tal homem nunca existiu.

Evidentemente pode ser que eu perca a aposta, mas, seguindo uma regra geral, jogo na certa. Ora, se fores prudente, não te darás ao trabalho de explicar ao teu "ajudante" que Corrégio se escreve com "C" e não com "K", mas limitar-te-á a dizer calmamente, esboçando o melhor sorriso: - "Não faz mal... não se incomode". É essa dificuldade de atuar independentemente, essa fraqueza de vontade, essa falta de disposição de, solicitamente, se por em campo e agir, são essas coisas que lançam o Socialismo puro para um futuro bastante remoto. Se os homens não tomam a iniciativa de agir em seu próprio proveito, que farão se o resultado de seu esforço resultar em benefício de todos? Por enquanto parece que os homens ainda precisam ser dirigidos.

O que mantém muito empregado no seu posto e o faz trabalhar é o medo de, se não o fizer, ser despedido no fim do mês. Anuncia-se precisar de um taquígrafo e nove entre dez candidatos à vaga não saberão ortografar nem pontuar, e - o que é pior - pensa não ser necessário sabê-lo.

- "Vê aquele funcionário - dizia o chefe de uma grande fábrica. É um excelente funcionário. Contudo, se eu lhe perguntasse por que seu trabalho é necessário ou por que é feito dessa maneira e não de outra, ele seria incapaz de me responder. Nunca deve ter pensado nisso. Faz apenas aquilo que lhe ensinaram, há mais de 3 anos, e nem um pouco a mais".

- "Será possível confiar-se a tal homem uma carta para entregá-la a Garcia?”.

Ultimamente temos ouvido muitas expressões sentimentais demonstrando simpatia para com os pobres entes que lutam de sol a sol, para com os infelizes desempregados à cata de trabalho honesto, e tudo isso, quase sempre, entremeado de muita palavra dura para com os homens que estão no poder.

Nada se diz do patrão que envelhece antes do tempo, num esforço inútil para induzir eternos desgostosos e descontentes a trabalharem conscienciosamente; nada se diz de uma longa e paciente procura de pessoas que, no entanto, muitas vezes nada mais faz do que "matar o tempo" logo que ele volta às costas. Conheço um homem de aptidões realmente brilhantes, mas sem a fibra necessária para dirigir um negócio próprio e que ainda se torna completamente nulo para qualquer outra pessoa devido à suspeita que constantemente abriga de que seu patrão o esteja oprimindo ou tencione oprimi-lo. Sem poder mandar, não tolera que alguém o mande. Se lhe fosse confiada a mensagem a Garcia retrucaria, provavelmente: "Leve-a você mesmo!". 

Hoje esse homem perambula errante, pelas ruas em busca de trabalho, em estado quase de miséria. No entanto, ninguém se aventura a dar-lhe trabalho porque é uma personificação do descontentamento e do espírito da discórdia. Não aceitando qualquer conselho ou advertência, a única coisa capaz de nele produzir algum efeito seria um bom pontapé dado com a ponta de uma bota 44, sola grossa e bico largo.

Pautemos nossa conduta por aqueles homens, dirigente ou dirigida, que realmente se esforçam por realizar o seu trabalho. Aqueles cujos cabelos ficam mais cedo envelhecidos na incessante luta que estão desempenhando contra a indiferença e a ingratidão, justamente daqueles que, sem o seu espírito empreendedor, andariam famintos e sem lar.

Estarei pintando o quadro com cores por demais escuras?

Não há excelência na nobreza de si mesmo; farrapos não servem de recomendação. Nem todos os ricos são gananciosos e tiranos, da mesma forma que nem todos os pobres são virtuosos.

Todas as minhas simpatias pertencem ao homem que trabalha, fazendo o que deve ser feito, melhorando o que pode ser melhorado, ajudando sem exigir ajuda. É o homem que, ao lhe ser confiada uma carta para Garcia, toma a missiva e, sem a intenção de jogá-la na primeira sarjeta, entrega-a ao destinatário. Esse homem nunca ficará "encostado", nem pedirá que lhe façam favores.

A civilização busca ansiosamente, insistentemente, homens nessa condição. Tudo que tal homem pedir, se lhe há de conceder. Precisa-se dele em cada vila, em cada lugarejo, em cada escritório, em cada oficina, em cada loja, fábrica ou venda. O grito do mundo inteiro praticamente se resume nisso:

“PRECISA-SE - E PRECISA-SE COM URGÊNCIA - DE UM HOMEM CAPAZ DE LEVAR UMA MENSAGEM A GARCIA”."


Elbert Hubbard.

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Três frases sobre a sabedoria

Alinho abaixo três frases sobre a sabedoria, que postei neste blog em outros momentos. Elas estão na ordem em que foram postadas.

“Nossos conhecimentos nos destroem. Embebedam-nos com o poder que nos dão. A salvação única está na sabedoria ”

Will Durant


“Não sei ainda o que é exatamente a sabedoria. Se soubesse, seria um sábio”

Rosenvaldo Simões de Souza


“A sabedoria é a compreensão do eu e do mundo. Nenhum deles pode ser ignorado”

Miroslav Holub

Os links nos nomes levarão às postagens originais. A minha frase, a do meio, é na verdade uma dúvida. Durant afirma; eu tenho dúvidas; Holub responde o que acha ser a sabedoria.

Miroslav Holub foi um poeta e imunologista tcheco, nascido em 1923 e falecido em 1998.

Compreender o eu e compreender o mundo.

O primeiro deles, Durant, um historiador, rejeita o simples conhecimento e elege a sabedoria como salvação. Eu, que não sou sábio, deduzo que se  solução está na sabedoria, então eu não tenho salvação. E Holub, um sábio, ensina, ou sugere, ao menos, que a sabedoria, e portanto, a salvação, está na compreensão do eu e do mundo.

Eu tenho dito que não concordo muito com Durant, porque não acredito na dicotomia entre conhecimento e sabedoria, mas em fusão entre as duas formas de saber. Mas, quem sou eu?

Como compreender o "eu"?

Em princípio, parece que Holub não diz nada de novo. Há na mitologia grega o Oráculo de Delphos, com suas duas máximas muito famosas: "Conhece a ti mesmo" e "Nada em excesso". Mas não é isto o que diz Holub. A "compreensão do eu" e o "conhece a ti mesmo" talvez sejam a mesma coisa, mas "compreensão do mundo" não significa "nada em excesso". Holub, que certamente não ignorava as duas máximas gregas, deu dois passos importantes: ignorou o "nada em excesso" como componente da sabedoria, e elegeu como parte desta "a compreensão do mundo".

O que é compreender o mundo?

Como se compreende o mundo, este mundo tão vasto, antigo e confuso?

O que ele quis dizer com isto? E o que ele quis dizer com "compreensão do eu"?

Posso entender "compreensão do eu" como sendo o mesmo que "conhece a ti mesmo"? Acho que sim.

E quanto à "compreensão do mundo"? Acho que tenho uma ideia do que ele quis dizer. Vou tentar explicar usando uma outra frase que postei neste blog. Mais uma vez, o link leva à postagem original:

"Os filósofos limitaram-se a interpretar o mundo de diversas maneiras; o que importa é modificá-lo."


A Filosofia e a Psicologia unem-se para, em conjunto, formarem a sabedoria?

Não sei.

Se soubesse, seria um sábio.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Exportando blogs

Eu disse aqui, em 2004, que a plataforma do UOL Blog poderia ter um mecanismo pelo qual pudéssemos exportar o conteúdo de nossos blogs para um outro lugar qualquer, como uma forma de backup, por segurança.

Agora, pergunte-me se o UOL tomou qualquer tipo de providência desde então.

Obviamente que não.

Mas o Blogger, sim.

O Blogger já nasceu com esta funcionalidade óbvia. Ele importa e exporta blogs com um simples clicar de mouse.

Dizem que nós, brasileiros, somos preconceituosos com relação a nós mesmos.

Ora, uma das empresas pioneiras em tecnologia na Internet no país, o UOL deveria ter um mínimo de iniciativa no aperfeiçoamento de seus produtos. Mas não.

Resultado: migrei meu blog do UOL Blog para o Blogger e não volto mais.

Quando exporto meu blog para a forma de um arquivo único e depois converto este arquivo em um documento PDF, ele se transforma em um tipo de livro que já atinge mais de 300 páginas. Não é pouca coisa. Não posso dar-me ao luxo de perder este monte de postagens. Preciso de um backup à mão que funcione de maneira fácil e rápida.

Assim, o Google, que é o dono do Blogger, vai tomando conta do mundo.

Das cavernas ao Século XIX

Eu prossegui em meu relato:

"Eu disse que poderia falar sobre tudo que já ocorreu no passado para justificar eu ser quem sou. Disse também que este raciocínio é errôneo, de forma que resolvi me restringir a iniciar minha história contando a partir daquilo que sei dos meus antepassados mais remotos. Senão, vejamos.

É possível e provável que haja milhões de nomes em livros e registros, de pessoas que já existiram, com datas de nascimento e de morte. No entanto, esses nomes nada me dizem, e não conheço suas histórias de vida. Se alguém foi herói ou bandido, famoso ou desconhecido em sua época, pouca relação tem comigo, se não sei quem foi e se ainda não tenho conhecimento de que eu tenha algum vínculo com ele. Os méritos e deméritos deste alguém são somente dele mesmo. Podem significar muito, mas como causas explicativas para elucidarem quem sou não significam nada, a menos que eu tenha algum parentesco com ele. Quer dizer, o passado de alguém que já não vive só me dirá algo se esse alguém for algum meu antepassado. Sua vida, se conhecida, ajudará a me fazer entender um pouco desse mistério que me atormenta, e do qual não consigo me despregar. 

Mas eu vim ao mundo não como fruto de qualquer par de seres humanos, de qualquer pai e mãe. Eu vim como fruto de um pai e uma mãe bem definidos. Eu nasci em uma época em que podemos registrar a sequência de nascimentos e mortes. Eu não sou o único humano que nasceu do mesmo casal, mas sou decididamente filho de um casal específico.

Mas meus pais também são filhos de pais específicos. E meus avós também.

Então, em qual momento perco o fio da linha que me liga ao primeiro dos casais, ao Adão e Eva primordiais?

Eu perco a linha no momento em que não tenho nenhum nome a identificar alguém em especial como um ser humano do qual descendi seguramente.

Eu tenho milhares de ancestrais desconhecidos, isso é certo. Mas nada sei deles. Então, como posso contar suas histórias, se não sei quem foram?

Mas, de certa forma, sei alguma coisa sobre meus antepassados. Sei o suficiente para retroceder no passado até aproximadamente o ano de 1820. Mas por que 1820?

Porque, embora não tenha documentos para provar, tenho na memória o relato oral de pessoas que asseveraram ser este o passado, e prefiro me fiar nesses relatos a limitar minha história ao que os documentos comprovam.

Mas tem um entrave em simplesmente eu sair contando o que sei sobre algum antepassado remoto que tem suas origens por volta de 1820. É que as pessoas vivem dentro de contextos históricos. As pessoas nascem em países que passam por crises, em momentos em que a vida requer decisões sérias, ou simplesmente vivem em épocas em que as coisas só poderiam ser explicadas com base em um contexto histórico próprio. Eu não poderia, por exemplo, dizer que um parente antigo veio à América. Veio como? Ora, se veio no século XIX, certamente não veio em um vôo comercial. Essa informação não foi inserida nos relatos orais aos quais tive conhecimento, mas são dedutíveis dentro de um contexto maior, e precisa ser contada, sob o risco de termos uma história fantasiosa, margeando o reino dos contos mágicos medievais. Na verdade, é com este clima que as pessoas costumam falar de antepassados obscuros e misteriosos. 

O passado em geral é de fato brumoso quando se trata do passado de pessoas comuns. Não culpo os narradores de histórias orais, sejam quem forem, por não saber narrar os detalhes que fazem com que uma história pessoal faça sentido dentro de um contexto histórico maior. Vivemos em uma época onde a informação é fácil, mas não se pode esperar que pessoas mais velhas e menos instruídas dispusessem dessa facilidade quando vivendo em décadas passadas em um país tão pobre quanto foi o Brasil. Assim, na medida do possível, tentarei corrigir essa distorção, clareando a bruma com fatos históricos contemporâneos às histórias que contarei.

Rumo às brumas, então. Rumo a algum lugar do tempo, por volta de 1820, que é o momento no qual mais profundamente posso retroceder, sem que passe da lenda à invenção e à ficção desavergonhada e pura. "

Este final foi em parte adaptado deste post

domingo, 11 de novembro de 2012

Conversando sobre os velhos tempos

Eu continuei meu texto sobre meu passado assim:

"Ah, mas como seria tudo mais simples se eu pudesse apenas conversar com as pessoas! Se não pretendo escrever um trabalho histórico, poderia ao menos matar minha curiosidade sobre o passado do lugar onde nasci simplesmente conversando com as pessoas mais velhas que ali viveram.

Mas isso não existe mais.

É verdade: a conversa desapareceu. Sou testemunha disso e afirmo com toda a categoria essa realidade. Ninguém mais está disponível para uma simples conversa que dure mais do que dez ou quinze minutos, por mais prazerosa ou importante que ela seja.

A correria do mundo nos engoliu.

As pessoas têm compromissos, precisariam fazer milhares de coisas ao mesmo tempo e o diálogo não faz parte de nenhuma lista de prioridades. Os telefonemas custam caro e os bate-papos on-line não são nem uma sombra do que seria um papo verdadeiro em uma sala ou cozinha, regada a bolos e xícaras de café em uma tarde tranquila de um fim de semana comum.

Não a culpo, a vida moderna. Ela é assim mesmo. Afinal, o passado é apenas o passado. As pessoas têm mais o que fazer além de ficar revirando o passado.

Assim, meu trabalho de registro deu-se aos trancos, e tão falho quanto um pente velho. Também não me culpo. A vida é dura para com aquilo que já passou, e todo tempo é escasso.

Achei que o melhor a fazer seria garantir o que vivi pessoalmente, tentando registrar memórias sobre o que vivi, vi e ouvi falar de meus antepassados até onde foi possível retroceder no passado obscuro. É verdade que não é nada tão antigo ou espetacular, mas a memória era a única fonte a qual eu tive acesso ilimitado e é fonte ainda razoavelmente confiável e disponível.

Precisei escrever com uma certa urgência, buscando tirar proveito da memória ainda firme, ou antes de perder o interesse pelo assunto. Afinal, evitei deixar para escrever depois de velho, temendo correr o risco de ver o interesse pelo assunto desaparecer, sobrepujado pelas tarefas da terceira idade. Melhor garantir as memórias enquanto elas ainda possuem algum valor.

Eis o que consegui juntar."

Na verdade, o que escrevi foi uma adaptação desta postagem.

Mas as coisas estão mudando. O Facebook abriu novas possibilidades. Podemos, sim, conversar sobre os velhos tempos, embora que não pessoalmente.

Veja só como de fato algo que parece ter acontecido ontem já faz parte dos velhos tempos: eu disse aqui que meu sobrinho acabava de nascer. Pois bem, ele tem hoje oito anos. Daqui a alguns anos ele será um adolescente, e logo mais, um adulto.

Eu serei um velho.

Assim, precisamos conversar sobre os velhos tempos.

Urgentemente.

Sobre o querer

Eu disse que o sucesso é difícil depois de tentar ser disciplinado e não obtê-lo da maneira fácil como imaginei que o obteria.

Mas eu disse aqui que a busca do sucesso implica em se definir antes o que é sucesso.

Eu disse que, genericamente falando, sucesso:

"É ter objetivos, lutar por eles, atingi-los e sentir-se satisfeito com isso."

Ora, se o sucesso é tão difícil, qual a razão disto?

Será que nunca tive objetivos?

Será que nunca lutei por eles?

Será que nunca atingi nenhum dos meus objetivos?

Ou será que, apesar de tudo, sou apenas uma pessoa que nunca se satisfaz com nada?

Ter objetivo, simplifico, não precisa ser entendido aqui necessariamente como um conceito técnico, tal como a Administração define. Eu não preciso ter um plano formal no Microsoft Project 2010 perfeitamente controlado para dizer que tenho um objetivo.

Basta perceber que tenho um simples desejo para dizer que, em princípio, tenho um objetivo.

Então, se assumirmos que desejar algo é ter objetivos, refaço a primeira pergunta:

Será que nunca tive desejos?

Mas obviamente que sim, desde o momento em que nasci.

Desejar é parte da condição humana.

Viver é desejar.

Sobre o querer humano, há muito o que dizer. Mas, e quanto ao meu querer, o que dizer?

Começou somente depois de ter lido Og Mandino? Obviamente que não.

Desejei muitas coisas antes.

Mas, quando um querer pode ser levando seriamente em conta? Porque as crianças querem tudo, e eu certamente quis coisas quando era criança. 

A partir de que momento em minha vida comecei a querer coisas de modo que posso identificar claramente não somente uma birra infantil, mas uma semente de desejo que já tinha em si um embrião de uma vontade pessoal forte o suficiente e realista o suficiente para não ser encarado por mim mesmo como uma fantasia irreal ou um mero capricho de bebê?

O nosso querer é algo incontrolável?

O nosso querer é influenciável?

Queremos de fato ou achamos que queremos o que queremos quando na verdade outras pessoas querem por nós?

Qual foi meu primeiro querer?

Olhe eu novamente revirando as cinzas frias do passado...

As histórias wiki

Eu disse aqui que é difícil obter documentos que ajudem a entender a história de um lugar, de um povo, quando muito pouco foi preservado, ou as pessoas não se interessam em abrir seus baús de lembranças e disponibilizá-las ao mundo.

Mas eu tenho esperanças.

As pessoas mais novas vão envelhecendo e percebendo que o passado tem seu valor. Vão percebendo também que não existe "a minha vida pessoal", mas sim "a nossa vida em comunidade". Somos animais sociais.

Aquela foto antiga em que só temos olhos para nós mesmos não mostra somente nós mesmos. Mostra mais uma amigo, um parente, uma casa, um objeto, um ambiente, um contexto. Tudo o mais que é mostrado tem interesse para alguém, seja lá quem for. Uma fotografia fala para todos. Ela trás recordações para diferentes pessoas, por diferentes motivos.

Eu escrevi assim em meu texto:

"Mas posso contar o que sei, embora o que saiba sobre Tujuguaba em si seja relativamente pouco. Mas eu vou tentar. 

Não veremos aqui fatos muito bem documentados. Em princípio, tudo se resume a deduções com base no que sei depois que nasci e às famosas pesquisas na Internet. Mas a Internet está longe de oferecer a facilidade de pesquisa que necessito ter para um trabalho dessa natureza. A Internet registra muito bem o tempo presente, mas o passado está fora de seus registros, ao menos por enquanto. É verdade que documentos antigos vão aos poucos sendo digitalizados e incorporados ao patrimônio digital on-line, mas não temos hoje ainda o necessário.

Assim, vou recolhendo migalhas daquilo e daqueles que surgiram antes de mim por meio de minha própria memória, na qual guardei histórias antigas sobre coisas e pessoas já passadas, e com base em alguma pesquisa histórica em livros e internet. Esse é meu método.

Não é, definitivamente, o melhor dos métodos, mas eu não pretendi fazer deste texto um trabalho preciso de História. Não que não seja interessante algo desse gênero. Na verdade, há já algumas iniciativas desse tipo de trabalho. Claro, há pessoas de minha cidade que ainda reverenciam nosso passado comum e sempre lutaram e lutam para preservar a memória de nossa comunidade, mas não é uma tarefa fácil, seja para um leigo, como eu, seja para um historiador profissional com meios e tempo para pesquisas aprofundadas com base em elementos escassos."

Certo.

Então, eu vou guardando tudo o que anda sendo postado sobre o lugar e as pessoas que viveram onde vivi. Ainda é pouca coisa, mas espero aos pouco sensibilizar meus conterrâneos contemporâneos a se darem ao trabalho de divulgar nosso passado comum. Afinal, não publicar uma foto que interessa a muitas pessoas é uma forma de egoísmo social que não tem justificativa nos dias atuais, onde tudo se mostra nas redes sociais em tempo real.

Assim, faremos nossa história, porque podemos. Temos os meios para isto. Temos a sensibilidade para esta tarefa.

Temos o dever social de deixar aos nossos descendentes tudo aquilo que está sob nossa guarda, mas que não pertence somente a nós, mas a todas as gerações, porque estamos aqui de passagem, e os que virão precisarão saber o que sabemos, num processo sem fim.

Sempre haverá tujuguabanos, e se um dia não houver, o mundo deverá saber que já houve. Tujuguabanos, assim como gregos, troianos, babilônios e índios.

Vamos fazer uma história colaborativa. Ah! Sim, faremos!

A nossa história wiki.