quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Mothman ou o sobrenatural

Eu disse aqui sobre um filme que assisti três vezes. Trata-se de Mothman, um filme sobre o homem-mariposa, uma suposta criatura sobrenatural, estrelado por Richard Gere. Dado que esse é um grande ator, não estou falando de um mero filme de terror de categoria C. Estou falando de um filme que tem alguma consistência temática.

Não há exatamente nada de terrível no filme em si, mas há algumas passagens que me fizeram pensar um pouco mais sobre o estranho mundo em que vivemos.

Não é que eu acredite em monstros sobrenaturais. Eu não posso dizer que seja um crédulo no sobrenatural. Por outro lado, devo admitir que o mundo tal como o conhecemos hoje apresenta mais mistérios do que somos capazes de explicar satisfatoriamente. 

Então, não é uma questão de crença, mas de curiosidade a respeito das possíveis implicações que eventuais respostas a eventos tidos como sobrenaturais podem acarretar.

Historicamente a ciência tem sistematicamente demolido supostos fenômenos sobrenaturais ao longo dos séculos, e não podemos duvidar que mais dia, menos dia, ela acabará desvendando os que ainda restam sem explicação plausível.

Acontece que o registro de coisas estranhas no nosso planeta não para de ocorrer. O mundo continua a nos surpreender quase que diariamente com acontecimentos estranhos, alguns curiosos, alguns assustadores, alguns velhos conhecidos, outros novos e impressionantes, mas de qualquer maneira, acontecimentos que não podem ser explicados com facilidade por uma pessoa comum, e aparentemente, nem pela ciência atual.

Ora, se a ciência não pode explicar algo, o que o explicaria?

Somos forçados a procurar respostas em outras esferas do saber humano, e em geral, apenas explicações teológicas, mágicas, costumam apresentar alguma coerência que satisfaça nosso intelecto.

Dado o fato de que a ciência costuma explicar esses fenômenos mais cedo ou mais tarde, eu tenho a tendência de não procurar refúgio em explicações místicas ou teológicas, mas há casos considerados muito difíceis de serem explicados, ou cuja explicação mística ou teológica nos levaria a uma situação que a razão considera longe demais para se ajustar à nossa realidade.

Mas, além da mera curiosidade pelas explicações desses fenômenos, há uma razão maior para eu ter interesse no paranormal. É que a sociedade ocidental está direta ou indiretamente firmada na efetiva existência deles, e mais, a sociedade ocidental moderna lastreia-se na convicção de que a razão, a explicação para esses fenômenos é de ordem teológica. Logo, ou a civilização ocidental está errada de maneira quase estrutural, ou ela está segura de suas razões, e então, as possibilidades de entendimento do mundo são muitíssimo mais numerosas.

No fundo, no fundo, parece haver uma quase necessidade de que esses fenômenos sejam inexplicáveis pela ciência, e somente explicáveis razoavelmente pela teologia. Do contrário, todo um mundo de civilização desaba.

Se esse mundo desabar, e eu acho que em parte ele já desabou, fica um imenso vazio, que é muito difícil de ser preenchido.

Mas não temos certeza, nem eu, nem a ciência moderna.

Daí que o assunto é curioso, pertinente e urgente.

Se você ainda não se convenceu disso, eu de minha parte já me convenci, e darei minhas razões aqui, para quem quer que queira apreciá-las ou refutá-las.

Atrás do corre-corre do dia-a-dia, paira sempre uma dúvida, nas horas mais escuras e silenciosas de nossas vidas.

Eu me recuso a não enfrentar essa dúvida.

A solidão urbana

É curioso ler aqui que a dez anos atrás eu me sentia solitário, quer dizer, eu tinha poucos amigos quando morava em um bairro de Goiânia. Acontece que esse tipo de isolamento social, essa falta de amigos, é na verdade um sintoma de uma realidade que não posso contestar: viver em um ambiente urbano moderno implica em estar sempre fisicamente rodeado de gente, mas sempre social e emocionalmente isolado.

Já morei em cidades pequenas e grandes e sei do que falo. 

Evidentemente, sei que é possível de se viver em uma cidade grande e ainda assim ter muitos amigos, mas é muitíssimo mais fácil ter um monte de amigos em uma cidade pequena que em uma grande.

Se você estiver andando por uma rua movimentada de uma grande cidade e chegar a esbarrar em alguém, poderá chegar a pedir desculpas, trocar algumas palavras com a pessoa e ir em frente. Mas as chances de tornar a vê-la são ínfimas. Já em uma cidade pequena, certamente você não terá quase nenhuma situação que lhe ocorra de esbarrar em alguém, porque não são muitas pessoas circulando ao mesmo tempo em lugares movimentados. Em compensação, você passará a ver sempre os mesmos rostos a uma certa distância, e a rotina os fará conhecidos. Essa constância nos contatos, ainda que superficiais, pode não redundar em amizade necessariamente, mas acabará fazendo com que você se familiarize com as pessoas com as quais encontra ao longo do tempo, e mais cedo ou mais tarde, acabarão se tornando ao menos conhecidos, em uma cidade pequena.

Daí o senso de coesão social experimentado por moradores de cidades menores.

Mas isso é quase impossível em grandes cidades. Talvez, quem sabe, seja possível alguma coesão social nos locais de trabalho. Mas mesmo assim, é de se duvidar: trabalhei em lugares onde conviviam 200, 800, 1500, 2.500 e mesmo 4.000 pessoas. Isso significa que há mais gente aglomerada em um único grupo de prédios de escritórios que em muitas vilas e cidades pequenas pelo mundo afora.

Nasci em Tujuguaba, um vilarejo que creio que nunca teve mais que 1.000 habitantes em sua zona urbanizada e zona rural. Hoje, acho que a zona urbana de lá não possui mais que uns 700 habitantes. Todos se conhecem a um longo tempo. É bem diferente de um prédio com 20 andares imensos com 100 pessoas trabalhando em cada andar. A mobilidade de pessoas em um lugar assim é constante. Não se consegue consolidar mais que umas poucas dezenas de amizades, a maioria superficiais.

Em uma cidade grande como São Paulo, onde moro agora, ter um amigo morando em determinado local da cidade é o mesmo que tê-lo vivendo em outra cidade, ou mesmo outro estado, tamanha a distância física e social que separa as pessoas.

As pessoas apenas coexistem.

Se respeitam, é verdade. Se você trombar com alguém em uma esquina, terá um pedido de desculpas como o teria de um amigo, mas é só.

É a solidão das multidões.

E é preciso aprender a conviver com isso.

Florescendo


Eu disse aqui que os gregos antigos tinham por hábito dizer que certa pessoa do passado floresceu em determinado período da história grega, e não diziam que ela nasceu no dia x, do mês y, do ano z, como fazemos hoje.

Sei que eles usavam esse termo, florescer, porque li sobre alguns filósofos gregos antigos em uma coleção de livros sobre filosofia chamada Os Pensadores. Há um volume deles dedicado somente aos filósofos chamados pré-socráticos, porque viveram antes de Sócrates, o primeiro de uma série de filósofos de uma época de ouro da civilização grega, a cerca de 400 anos antes do nascimento de Cristo.

Hoje, não florescemos mais. Simplesmente vivemos de uma data x até a morte, quando então uma certidão de óbito dará até os minutos exatos de nossa morte.

Naquela época, a dos gregos, não havia um calendário tão bem elaborado quanto o nosso, nem relógios tão sofisticados ou precisos. Mas, mais que isso, creio que a civilização grega, e todas as outras mais que existiram antes da nossa, não davam assim tanta importância às minúcias do tempo. Não levavam assim tão a sério a exatidão das horas, do mesmo jeito que acho que há pessoas, sociedades e lugares que ainda hoje não dão essa importância.

Vivemos em uma época que a um grego antigo pareceria absurda. Um relógio qualquer que hoje todo mundo usa seria um objeto desnecessário também a qualquer outro povo do passado, tal como a um egípcio dos tempos dos faraós. Ele poderia nascer, florescer e viver sem se preocupar em saber se a hora do almoço seria antes ou depois do meio-dia exato. Simplesmente comeria quando tivesse fome, num momento do dia em que o hábito de sua sociedade determinasse aproximadamente que fosse o horário de comer e pronto.

Hoje, não florescemos, e sentimos fome sem poder comer, porque ainda não está na hora, embora tenhamos relógios perfeitos.

E não filosofamos nem construímos mais pirâmides.

Alguma coisa se perdeu ao longo dos séculos e de alguma forma, a simples inexistência da palavra florescer entre nós parece denunciar que o que foi perdido nos faz falta. 

Se o que foi perdido foi substituído pela tecnologia, e esta se gaba de ter nos dado relógios, acho que não foi uma boa troca.

Perdemos nosso florescimento e ganhamos a exatidão em nosso tempo de comer e morrer.

Bela troca.


quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

O bem comum

Eu disse nesta postagem que andei pensando sobre socialização e como um blog pode atender aos meus próprios interesses pessoais, mas também aos interesses de meus eventuais leitores. Quer dizer, eu tiro algum proveito quando escrevo meus textos neste blog, e o benefício que obtenho relaciona-se com o prazer que sinto em escrever sobre assuntos que me agradam, a clareza que obtenho a respeito de determinados assuntos que acho relevantes, porque quem escreve sabe que é mais fácil ordenar as ideias por meio da escrita que por meio da fala ou de outro meio, como o simples pensar silencioso sobre elas.

Agora, que ganha com isso, com a leitura de meus textos, um eventual leitor?

Depende de quem lê.

Os seres humanos são únicos. Todos sabemos o quanto somos diferentes dos nossos semelhantes. Na verdade, nem sei porque somos chamados de semelhantes, se somos assim tão diferentes.

Somos um tipo de animal (e somos mesmo animais, quer gostemos disso ou não) que tenta entender a si mesmo, mas esse entendimento é muito difícil.

O que temos em comum com nossos semelhantes?

Somos, é claro, muito diferentes, mas temos também muitas semelhanças.

Não acho que ressaltar diferenças seja mais ou menos importante que ressaltar semelhanças. Mas parece-me que ressaltar semelhanças pode, à primeira vista, ter melhores resultados que ressaltar diferenças. Digo à primeira vista porque certamente há situações em que afirmar um diferença pode ser melhor que realçar uma semelhança. Creio que o contexto onde se dá uma comparação é que dirá se é melhor enfatizar semelhanças ou diferenças.

Qual a razão dessa pequena digressão a um assunto que aparentemente nada tem a ver com textos e blogs?

É que meus textos são públicos. E é preciso ter em mente que somos seres sociais. Estamos sempre influenciando e sendo influenciados pelos nossos semelhantes.

Alguém recomendará que eu não me preocupe com essa questão da influência entre seres humanos por três motivos:

1 - Ninguém está se importando muito com o que eu escrevo. Não devo me levar tão a sério assim. Não devo me dar tanta importância assim, porque as pessoas não são folhas ao vento, que mudam de opinião como mudam de roupa de acordo com o que leem em meu blog.

2 - Meus textos não são realmente convincentes. Eu não consigo mudar ninguém, ainda que me esforçasse para isso. Então, seria preciso aprimorar meus dons argumentativos, e deixar de subestimar as razões alheias.

3 - As pessoas não mudam da maneira que acho que mudam. Elas mudam, sim, mas não em razão de textos meus ou de quem quer que seja. Elas mudam muito lentamente por razões que a razão desconhece. Há mais emoção e irracionalidade nas decisões das pessoas do que supomos e mesmo se eu tentasse mudar as pessoas, não seria nem o primeiro, nem o mais esforçado e nem o último a tentar e fracassar, porque há muita gente tentando séria e esforçadamente fazer a cabeça das pessoas, mas não conseguem. Logo, não devo me preocupar com o que escrevo, porque meus textos não conseguirão (nem os textos de ninguém) provocar algum mal ou bem em quem quer que seja.

E eu sou tentado a dar certa razão a alguém que fizesse essas advertências a mim.

No entanto, pensando no assunto, eu devo lembrar a mim mesmo de que não me cabe disseminar o mal, e se for para deixar públicas minhas ideias, que sejam ideias que promovam o bem comum, que tenham um senso de utilidade, porque não vejo razão para agir diferentemente.

Quão a razão para promover o mal?

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Escravidão química

Você fuma?

Você bebe?

Você usa cocaína? Maconha? Crack?

Você se considera livre das centenas de possíveis vícios por produtos químicos e livre de vícios psicológicos induzidos por produtos químicos?

Açúcar, gordura, sal, álcool: você está livre deles?

Escravidão química: pense nesse conceito, e em como ele é ao mesmo tempo tão presente e, no entanto, tão dissimulado, incompreendido, silencioso.

Pense na felicidade de ver-se livre definitivamente deles, para sempre!

Difícil?

Você não nasceu fumando. Seu pulmão nasceu livre.

Você nasceu puro.

Quem o corrompeu?

Quem o intoxicou?

Por que você aceita esse grilhão tão mansamente?

Você aceitaria que alguém o obrigasse a fumar um maço de cigarros todos os dias de sua vida?

Com o que se pareceria alguém que lhe exigisse tragar à força um cachimbo de crack? O quão aguerridamente resistiria a um ataque sórdido desses?

Quem nos envenena?

Você aceitaria trabalhar na Souza Cruz, Phillip Morris ou na, digamos, Ambev?

Você disse alguma coisa parecida com "drogas socialmente aceitáveis"?

Existe escravidão aceitável, do tipo psicológica ou química?

Existe meia droga?

Existe quase vício?

Existem "prejuízos físicos menores"?

Por que uma Souza Cruz ainda existe legalmente?

A liberdade legal pode permitir a liberdade de oferecer drogas a quem quer que seja?

As pessoas têm o direito de se autodestruírem?

Podemos proteger as pessoas delas mesmas?

Se não houvesse cordas, as pessoas se enforcariam?

Essas questões me intrigam.