quinta-feira, 4 de setembro de 2014

O que é exatamente o sucesso? - parte 2

Se você está lendo este texto, pode já ter conhecimento de quais sejam os cinco ingredientes do sucesso, segundo Og Mandino. Se você já leu a primeira parte deste texto, ótimo. Se você não leu e não sabe, eis os mesmos aqui:

1 - Propósito.
2 - Média de aproveitamento.
3 - Esforço.
4 - Satisfação.
5 - Espiritualidade.

Na verdade, quem primeiro elencou esses cinco ingredientes não foi o escritor Og Mandino, mas o também escritor Howard Whitman, em seu livro "O sucesso está em você".

Whitman pensou bastante sobre o assunto do que seja o sucesso, e ele chegou à conclusão que há basicamente dois tipos de sucesso. Primeiro, há o sucesso socialmente reconhecido, aquele no qual as pessoas reconhecem fama, fortuna, celebridade, poder e glamour, popularidade ou qualquer outro atributo que elas julgam merecedor de elogios, e que as pessoas que o tem destaquem-se dentre seus vizinhos em razão dele.

Segundo, há o sucesso pessoal, particular, íntimo, aquele no qual as pessoas nem sempre reconhecem algum mérito, e que aos olhos da sociedade, pode muito bem passar desapercebido, mas ainda assim, ser um tipo legítimo de sucesso.

Whitman afirma que o sucesso íntimo é tão legítimo quanto o sucesso social. Ele vai mais longe e afirma que os dois tipos de sucesso são autenticamente sucesso, mas que o sucesso íntimo é mais importante que o sucesso social. Ambos podem coexistir, mas podem aparecer na vida das pessoas isoladamente. Por fim, se é que seja possível apenas que apareçam isoladamente, é preferível que se tenha apenas o sucesso pessoal, porque o sucesso social isolado implica em fracasso íntimo, ou frustração, ou indiferença íntima, e isso não é nada bom.

Se parece difícil entender esses conceitos, Whitman nos faz uma comparação, e nos remete a uma garrafa de refrigerante e seu canudinho. Ele equipara o líquido refrigerante ao sucesso íntimo, e o canudinho ao sucesso social. Ambos formam um par que combina bem, mas se fosse para escolher entre o refrigerante e o canudinho, com qual dos dois você ficaria?

Obviamente, essa é uma opinião pessoal de um autor apenas, mas deve ser seriamente levada em consideração. 

Mas qual a diferença entre sucesso íntimo e sucesso social?

É que o sucesso social é apenas uma opinião de pessoas que normalmente não se importam se o dono do sucesso está intimamente bem ou feliz com aquilo que lhe dá o sucesso. Já o sucesso íntimo é a percepção que uma pessoa tem de si mesma. Uma pessoa considera-se um sucesso para si mesma em virtude de ter um atributo que considera uma fonte de felicidade, realização, orgulho, ainda que ninguém mais se dê conta disto.

De que adianta o mundo todo o considerar uma pessoa de sucesso se em seu íntimo você não se considera tanto assim?

Por outro lado, que importa se o mundo não reconhece seus méritos, desde que você, sinceramente, em seu íntimo, saiba que é um sucesso a seus próprios olhos e dentro de seus próprios critérios?

Seria bom que o mundo reconhecesse também esses seus méritos, mas se não o faz, que mal há nisso?

Com base nesses dois tipos de sucesso, parece que é mais útil ter sucesso íntimo que sucesso social, correto?

Na verdade, o sucesso íntimo, porque definido por apenas nós mesmos, é muito mais fácil de ser alcançado. Convenhamos: é muito mais fácil agradar a nós mesmos que agradar a dezenas, centenas, milhares ou milhões de pessoas ao mesmo tempo.

Mas, se o sucesso íntimo é tão mais útil e tão mais fácil de ser alcançado que o sucesso social, por que as pessoas hoje em dia se apegam tanto à busca do sucesso social e esquecem ou sequer sabem que o sucesso íntimo existe e é muito mais importante?

É o que veremos na continuação desta lição.

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Primórdios musicais

Eu sempre falo alguma coisa sobre música neste blog. Nas primeiras postagens, em 2004, eu andava ouvindo Frank Zappa.

Mas já que eu gosto de música, mas gosto também de pensar as coisas em termos de ideias a serem discutidas, ainda que apenas por mim mesmo, vou falar sobre algo que tenho planejado relatar já a alguns meses, mas não o fiz por falta de tempo: vou falar sobre os primórdios de minhas experiências musicais.

Eu, em 2004, ouvia Zappa. Antes disso, eu ouvia rock, e houve um tempo em que eu não ouvia nada, antes de 1970, porque eu não existia ainda. Essa constatação pode parecer boba, irrelevante, mas não é. Eu disse nas últimas postagens que gosto de literatura, mas gosto também de música. Ora, é verdade que gosto de ambas as formas de arte, mas confesso que minhas experiências de apreciação de música são muito mais antigas que as minhas experiências literárias.

Estou falando de um tipo de experiência, a experiência da apreciação musical, que pode dar-se, segundo a ciência, ainda durante nossa estada no útero de nossas mães.

Então, quando digo que minhas experiências musicais devem ser consideradas desde 1970, já que nasci neste ano, falo de uma maneira séria, porque, de certa forma, eu poderia ainda no útero de minha mãe já estar experimentando ouvir certo tipo de música ou som.

Mas, não.

Em 1970, evidentemente já havia muita música de todo tipo. Mas, em 1970 não era um fato comum as mães colocarem música para seus bebês ouvirem ainda no útero.

Não sei dizer desde quando os cientistas sabem que os fetos podem ouvir música ainda no útero. Creio que o sistema auditivo deve formar-se e amadurecer nos estágios finais do processo de formação de um feto, por isso, não faz muito sentido falar em fetos de poucas semanas ouvindo música, mas, de qualquer forma, eles, os fetos, podem ouvir música, digamos, no oitavo ou nono mês de gestação. Eles podem gostar de certos tipos de música? Talvez. É possível que as mães que façam experiências com seus bebês ainda no útero possam tentar e vir a saber se os bebês reagem e como reagem a músicas de tipos variados. Talvez os bebês fiquem mais calmos ou agitados dependendo do tipo de música. Não sei.

Uma coisa é certa: minha mãe não colocou música para eu ouvir enquanto eu ainda estava no útero. Ela provavelmente nem cantou para mim no útero. Sei disso porque se ela tivesse feito qualquer uma dessas duas coisas, ela me falaria. Nunca perguntei, na verdade, mas em 1970, meus pais não tinham nenhum tipo de aparelho de som em casa, nem televisão, nem nada que pudesse reproduzir algum som gravado em algum tipo de equipamento tecnológico. Em 1970, pouco gente tinha toca-discos, toca fitas ou rádio. E minha mãe nunca foi muito de cantar canções de ninar mesmo depois que nascemos, eu e meus dois irmãos. Ela nunca disse que cantava para nós ainda no útero. 

Se tivesse cantado, ou se tivesse tocado músicas para mim ainda no útero, eu me lembraria das músicas?

Não sei. Boa pergunta...

Bebês recordam-se de músicas depois que nascem? Guardam essas memórias por quanto tempo? Se sim, essas recordações desaparecem com o tempo? São perguntas para neurologistas e psicólogos...

Então, nasci perfeito, com o sistema auditivo normal, aprendi a ouvir e aprendi a falar normalmente, e em algum momento tive contato com a música.

Com canções de ninar é certo que tive contato. Poucas canções, duas ou três... Nana, nenê, que a cuca vem pegar...

Nos primeiros três, quatro anos de vida, continuamos sem aparelhos de som em casa. Mas então, um vizinho tinha um rádio.

Morávamos numa casa simples, e entre nossa casa e esse vizinho, havia um lote vazio, a que chamamos "data".

Uma data era um lote. Na verdade, eram dois lotes, mas chamávamos aquele pedaço de terra cheio de mato de data. 

Pois bem, entre nossa casa e a casa do vizinho, Sebastião Müller, havia a data da família dos Mistura.

Sebastião Müller era apenas o Bastião. Bastião Müller.

Bastião era descendente de imigrantes alemães, vindos da cidade de Limeira, no interior de São Paulo. Nós morávamos no vilarejo de Tujuguaba, pertencente ao município de Conchal, na região de Campinas. Em 1970, Tujuguaba era um grupo de casas tal como ainda é hoje, mas bem mais primitiva e pobre.

Bastião trabalhava na roça. 

Acordava cedo, lá pelas cinco da madrugada. Arrumava a comida, tirava água do poço, fazia marmitas, esquentava o fogão a lenha, tossia longa e profundamente devido aos longos anos de cigarro, e ouvia música em um rádio velho e grande, à válvula, que era de onde eu comecei a ouvir minhas primeiras experiências musicais das quais sou capaz de me recordar. Que tipo de rádio era: um Sânio, um Telefunken, um Philco, um Phillips? Não sei, mas apostaria que era um Telefunken.

Entre os anos de 1970 e 1975 houve rigorosos invernos. Naqueles anos, geou nos meses mais frios, e minha mãe nos acordava cedo para ver a fina camada de gelo sobre o mato da data. E do outro lado da data, a família dos Müller se preparava para o trabalho ouvindo rádio.

O que ouvíamos, nós e os Müller?

Música caipira.

Não me recordo de onde eram as estações de transmissão. Provavelmente eram das cidades vizinhas: Araras, Mogi-Mirim, Limeira. O mundo das rádios AM e FM é um mundo à parte.

Mas, pensando bem, naquela época creio que só se pegava no rádio dos Müller as ondas AM. Mas essas ondas são de longa distância. Então, era possível que eu ouvisse estações de longe, muito longe. Quem sabe de São Paulo, Rio de Janeiro ou ainda mais além. Não sei.

Eu me recordo de ouvir muito as músicas de Tonico e Tinoco. Eles dominavam as madrugadas com suas vozes agudas e suas letras caboclas. De quais músicas me recordo? Não sei... moreninha linda, do meu bem-querer, é triste a saudade longe de você...

Mas não só esta, é certo.

Na primeira metade dos anos 70 ainda havia muita gente que ouvia com saudade as duplas que se consagraram na década de 60 e mesmo na de 50. Não havia ainda duplas modernas como veríamos alguns anos depois. E, além do mais, havia outros tipos de música nas estações, mas os Müller só ouviam música caipira, porque ou só gostavam deste estilo, ou o aparelho só pegava aquela estação. Não importa. Seja por gosto, seja por falta de opções, eles, os Müller, ouviam sempre as mesmas coisas, e eu me recordo dessas madrugadas frias, o tossir longo e rouco do Bastião, o ranger das cordas no rolo da manivela do poço d'água, o estalar das panelas, e Tonico e Tinoco.

Eu nasci caipira, concluo.

A variedade do pensamento humano

Escrevi o último texto tratando de literatura, e fiz promessas dizendo que escreveria mais sobre o assunto. Não é agora, neste texto que estou escrevendo e você está lendo, que cumprirei essas promessas, porque meu pensamento está focado em outros assuntos que não mais a literatura.

É que meu cérebro é um órgão cujo foco de atenção é volátil.

Não sei dizer se todo mundo tem a mente volátil como eu tenho a minha, mas posso afirmar que eu tenho a mente volátil e portanto, não me fixo muito em um único assunto, nem neste blog e nem na vida real, nos sucessivos minutos em que estou lúcido e acordado, de forma que faço promessas exatamente porque não consigo me fixar em um assunto o tempo suficiente para tecer todas as considerações que consideraria adequadas. Quer dizer, pago o que devo em parcelas. Nos intervalos, salto para outro assunto, tal como um grilo, e agora, por exemplo, falo exatamente sobre esta característica bastante minha, a de ter uma ampla variedade de interesses em meus pensamentos corriqueiros, de maneira tal que não me fixo em quase nada, a não ser com muito esforço.

A variedade do pensamento humano é uma realidade, mas ela é um fato que é em grande parte decorrente da era da informação na qual vivemos. Confesso que me sinto consternado diante de tantas demandas apelativas clamando a minha atenção tão cara e escassa.

A variedade do pensamento humano, no entanto, não deve ser infinita, já que nem sempre gostamos de tudo.

Assim, embora eu goste muito de literatura, prefiro falar sobre outros assuntos.

De música por exemplo.

Dúvida?

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A literatura como forma de socialização

Dentre as muitas possíveis ideias que eu poderia discutir neste blog, discutirei primeiramente a própria existência dos blogs.

Eu poderia falar de outros assuntos, tal como música, política, finanças e astronomia, mas inicio pelo tema da literatura porque é disso que este blog trata: ele é uma ferramenta literária, mais que qualquer outra coisa.

Um blog pode prestar-se a uma série de utilidades, mas em geral podemos classificá-los entre blogs pessoais e comerciais, quer dizer, blogs que existem e pertencem a pessoas comuns e blogs que existem e pertencem a empresas.

Evidentemente, este blog é pessoal.

Ele não visa (ainda) a vender nada. Ele visa a disponibilizar meus textos, que tratam de uma variedade de assuntos, sem maiores pretensões financeiras.

Eu poderia considerar meus textos como não disponíveis ao público, e escrevê-los só para mim, como um mero registro privado.

Por que não mantenho meus textos privados? Por que escrever e disponibilizar ao mundo o que se escreve? 

Se o que escrevo não visa a vender nada para ninguém, então posso, despretenciosamente, chamar meu blog de não-comercial, pessoal, e por fim, literário. Não se pode concluir daí que ele tenha alguma qualidade literária, mas, de qualquer maneira, ele é uma forma de literatura.

E ele é público. Logo, as pessoas podem ler os textos e gostar ou não, sem maiores implicações.

Se o que escrevo é uma forma de literatura, e se esta literatura é pública, então podemos pensar em porque escrever e depois, podemos pensar em porque divulgar o que se escreve.

Porque eu escrevo um blog?

Eu escrevo este blog porque eu gosto de escrever.

Eu gosto de escrever faz um bom tempo. No momento em que escrevo esse texto tenho quarenta e quatro anos. Mas aprendi a escrever, quer dizer, fui alfabetizado quando tinha meus seis, sete anos. Aprendi a escrever em 1977. Sei escrever alguma coisa a trinta e sete anos.

Evidentemente, qualquer pessoa que tenha frequentado uma escola e tenha sido alfabetizada poderia ser classificada como escritora, se assim fosse tão simples. Não é este o caso, e de fato, eu não posso dizer que o que escrevi durante meus anos de escola tenha qualquer coisa de literária.

Como posso saber se o que escrevi é ou não algo de aspecto literário ou não?

Bem, penso que basta eu fazer um breve apanhado daquilo que escrevi ao longo da vida, e então posso saber desde quando venho escrevendo, e o que venho escrevendo sob o ponto de vista estritamente literário.

Antecipo que, qualquer que seja o resultado desse apanhado, ele não acusará de forma alguma que eu seja um escritor profissional.

Não, eu escrevo mais por prazer e consumo próprio que por qualquer outro motivo. Já arrisquei, admito, alguma coisa mais séria, mas foi apenas uma aventura. Hoje, sou um mero apreciador da arte de escrever.

Antes de um apanhado geral sobre o que escrevi, resta saber porque disponibilizar o que escrevo ao público.

Mas, nem tudo que escrevi foi disponibilizado ao mundo. Este blog é meu atual esforço literário, mas ao longo dos anos escrevi outras coisas, em outro formatos, e nunca disponibilizei nada a ninguém. É verdade que o surgimento da internet representa para mim, para todas as pessoas que gostam de escrever no mundo e para o mundo como um todo um marco inigualável em termos de facilidade de socialização de textos, mas afirmo categoricamente que já escrevia antes da internet surgir. O surgimento da internet apenas facilitou a disponibilização dos textos, penso eu.

Quando comecei a ir para a escola, em 1977, eu fui aos poucos aprendendo a escrever. Escrevi coisas que era preciso escrever, mas cadernos escolares não são formas tradicionais de expressão artística e não são considerados literatura.

Então, o que escrevi de literário ao longo de minha vida?

Preciso urgentemente fazer este inventário literário, mas não agora. Farei-o nos próximos textos, é certo.

Agora, tratarei da ideia da literatura como forma de socialização.

A literatura não técnica, a literatura não informativa, não comunicativa, não jornalística, a literatura verdadeiramente artística, não precisa ser disponibilizada ao público.

Evidentemente, a maioria das pessoas que escrevem o fazem pensando em um público que lerá aquilo que estão escrevendo. Mas essa verdade não precisa ser um regra, e muitas vezes não é.

Cito como um exemplo as cartas.

Ninguém escreve uma carta pensando em publicá-la. Mas elas muitas vezes são publicadas. Quem sabe um dia publiquem e-books de literatura reunindo coleções de e-mails trocados entre personagens de grande valor artístico, e então veremos que a tradição de se resguardar para a posteridade qualquer forma de obra escrita de pessoas dotadas do dom literário continuará, apesar da era digital.

Afinal, um conto de um Machado de Assis não seria menos doce ainda que fosse originalmente escrito em um arquivo do Word e encaminhado a um seu colega via e-mail. Creio que a forma digital não representa problema algum para aquele que escreve.

Aliás, eu só me interessei por computadores devido ao enorme potencial que eles mostraram na edição de textos. Esse assunto é fascinante, e falarei sobre isso em breve.

A questão é: um texto literário só é uma forma de socialização se ele, ainda que disponível ao público, seja de fato lido. Um texto meramente publicado, mas não lido, não comunica nada, não liga escritor e leitor de maneira alguma, porque falta exatamente a ponta da corrente de comunicação, que é o leitor. Logo, a literatura só é uma forma de socialização na medida em que as pessoas que escrevem encontram pessoas que leem seus escritos. Do contrário, escreve-se para todos, mas o texto é como um grito no deserto.

Este é o grande drama do escritor: encontrar quem se disponha a ler sua obra, e assim, satisfazer seu anseio de comunicação. Entendo que só possa ser este o desejo de quem torna público uma sua obra: a de vê-la lida por quem quer que seja. E então, eis a frustração e terror de qualquer escritor que publica: não ser lido.

Não é o caso se se escreve para si mesmo, ou para alguém que irá necessariamente ler o que o escritor produz. Uma carta que chegue ao seu destino cumpre sua função, e é lida por aquele que tinha de lê-la. Consuma-se o processo de comunicação desejado pelo autor e não se pode falar em frustração no sentido de que gritou-se no deserto. O leitor pode apreciar ou não o estilo, o conteúdo, mas não pode dizer que não foi alvo da mensagem a ele especialmente endereçada.

E há aquele que escreve para si mesmo, que tem em si mesmo seu alvo, e que lê silenciosamente sua própria obra, seja por que motivo for que não a divulga, e que assim também não se frustra. Pelo contrário, tem em si mesmo o seu melhor e mais perfeito público. Além do mais, se não gostar da própria obra, pode refazê-la da maneira que quiser. O escritor egoísta é também o mais elogiado, porque não tem grande chance de falhar.

Verdade esta última constatação?

Nem sempre. A história da literatura está repleta de obras destruídas pelo próprio autor, que na sua exigência de perfeição inatingível, preferiu a destruição do imperfeito, ainda que magnífico aos olhos alheios, que a mácula a seus próprios olhos insaciáveis.

Nestes casos, o escritor egoísta é também o mais criticado, porque nunca tem chances de acertar.

Logo, é o gosto do artista, do escritor, que define o que pode ou deve vir a público ou não. Ele sente que só pode compartilhar algo que ele próprio ache digno de algum merecimento, que ele ache que tenha um valor tal que seja possível de apreciação por parte de outros que não somente ele.

Quer dizer: publica-se somente aquilo que é suficientemente bom, e tem-se que aquele que publica é um generoso, pois quer que outros mais sintam o prazer que sentiu sozinho, e previamente, contemplando a própria obra.

Então, publicar requer três componentes: gosto adequadamente apurado para a apreciação da literatura semelhante a que se propõe a escrever e para a própria obra, generosidade para permitir que outros mais possam vir a sentir algum prazer com a obra tal como o próprio escritor sentiu ao vê-la pronta, e por fim, alguma humildade para aceitar que há gostos diferentes do seu próprio, e que nem todos sentirão o mesmo prazer que ele, dado que pessoas são naturalmente diferentes, e aceitar eventuais críticas negativas a respeito de sua obra de maneira leve e serena, porque um escritor sereno deve ter sensibilidade o bastante para saber que jamais agradará a todos.

Eu tenho esses três atributos? Se você escreve e publica, você os tem?

Veremos mais sobre gosto literário, generosidade e humildade nos próximos textos, pode apostar o seu chapéu que sim. E farei meu inventário, pode apostar uma orelha. Eu garanto.

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

O que é uma ideia?

O que é uma ideia?

Quando incubamos uma ideia, com o que estamos lidando, afinal?

Platão pensava o mundo das ideias como o mundo verdadeiro, e via o mundo material, este em que eu, você, todos nós vivemos, como uma mera cópia mal feita do mundo das ideias. Não deixa de ser uma teoria interessante, mas os séculos de experimentação e ciência, filosofia e debates parece ter refutado Platão.

Certo, tem gente que ainda acha que o mundo das ideias é o verdadeiro, mas não entrarei neste debate, porque o tempo é curto, meu conhecimento sobre as minúcias do tema é limitado e não é sobre esse conceito de ideia que quero falar.

Quero falar do conceito de ideia como proposta.

Ideias podem ser, platonicamente falando, estados de perfeição. Uma ideia seria um objeto perfeito. Por exemplo, Platão entendia que no mundo material em que vivemos, existe objetos vermelhos, mas não a cor vermelha. O vermelho como cor perfeita existiria apenas no mundo perfeito das ideias. Objetos de cor vermelha seriam apenas arremedos de objetos vermelhos ideais.

Assim, ideias, para Platão, são conceitos abstratos.

Certo, um blog que encuba ideias, debate, divulga ou aperfeiçoa ideias pode tomar ideias platônicas como tema, mas não é neste sentido que penso sobre ideias. Quando falamos aqui sobre ideias, falamos mais em possibilidades, projetos e coisas a serem feitas.

Por exemplo: não cabe discutir a cor vermelha com uma abstração da perfeição. Cabe discutir como tornar os objetos vermelhos, ou dizer que objetos vermelhos são melhores ou piores que outros objetos, ou ainda, aperfeiçoar a vermelhidão dos objetos, de modo a torná-los o mais vermelhos possível.

Divulgar a ideia de como evitar que um problema surja, ou de como solucioná-lo, é uma boa razão para a existência de um blog como uma incubadora de ideias.

Assim, o correto seria dizer que este blog pode ser uma incubadora de projetos, ou pré-projetos. Mas, projetos e pré-projetos parece envolver já algum grau de amadurecimento de pensamento, parece já envolver uma tomada de decisão de dar um passo no sentido de se concretizar algo que já foi devidamente pensado, embora possa ainda, por uma série de motivos, vir a não ser feito, não ser concretizado.

Ora, algo que ainda não é um projeto é o quê? Em que estágio está, por exemplo, uma casa cujas fundações não foram sequer esboçadas em um pedaço simples de papel? Se não há nada que a materialize em forma física, não há casa. Se temos apenas desenhos, não temos uma casa, mas um projeto de casa. Mas, se nem desenhos temos, mas apenas pensamos na casa em nossas mentes, então temos a ideia de uma casa. Ora podemos então usar palavras faladas e escritas para descrever, aperfeiçoar, debater sobre a casa, mas ainda assim não ter nenhum desenho, nenhum tijolo assentado. E ainda assim a casa pode estar muito bem elaborada do ponto de vista de planejamento, porque de fato seus possíveis problemas foram exaustivamente pensados, suas soluções discutidas, suas formas imaginadas.

Assim, o mundo das ideias tem sua utilidade, e usar um blog para discutir ideias parece ser bastante interessante.

Evidentemente, há infinitas ideias. Ideias precisam ser classificadas em compartimentos mentais para poderem ser incubadas. Assim, falaremos sobre ideias matemáticas, ideias científicas, ideias filosóficas, ideias econômicas, ideias tecnológicas, ideias sociais, ideias de solução de problemas diversos.

Além do mais, e exatamente porque as ideias são em número infinito, não trataremos de muitas. Pode-se tratar apenas de uma pequena fração delas. Podemos passar décadas pensando um tema qualquer sem nunca esgotá-lo, afinal.

E, por fim, há a necessidade e o gosto pessoal.

Parece-me que há ideias mais importantes que outras devido à necessidade que satisfazem. Por exemplo: é mais razoável perder tempo pensando uma ideia que busque a cura do câncer do que gastar tempo pensando em uma maneira nova de se curar um arranhão. As necessidades do mundo definem as prioridades dos problemas a serem tratados pela elaboração de ideias.

E, ainda que haja necessidades infinitas, não se pode satisfazê-las todas. E se temos que pensar, que seja sobre algo que, além de prioritário, seja de nosso gosto pensar.

Por que devemos pensar sobre o que gostamos? Porque simplesmente não conseguimos pensar direito sobre o que não gostamos. E se for para pensar por obrigação, então um blog não é mais uma fonte de entretenimento e prazer intelectual, mas um martírio e uma tarefa maçante e chata. E não produziremos nada de importante e útil pensando por obrigação. Vocação, gosto, desejo por algo é coisa que não temos assim tanto controle, e se é para pensar, que se pense sobre o que dá prazer, não importa o porquê dessa atração prazerosa.

Dadas essas breves explicações, esboçaremos algumas linhas de atuação para este blog, que entendo necessárias para um melhor entendimento de seu real potencial.

Continuem lendo.

Continuem...