domingo, 27 de junho de 2004

Estranha nostalgia

Antes de mais nada, quero dizer que acho horrível escrever nesse blog. A maneira como editamos o texto é esquisito. Não gosto de ter um tempo fixo para salvar o que quero escrever, nem de ter um limite para meus textos. Na verdade, se ao menos eu soubesse de quantas letras é o tamanho máximo permitido, já seria uma boa coisa, mas não sei. Esse blog me obriga a escrever rápido, errado e, pior, me obriga a escrever de maneira grosseira e feia. Isso tem de mudar. Não quero prazos nem limites. Fora isso, vamos em frente.

Estive hoje em Anápolis, uma cidade na qual morei por longos oito e amargos anos. Odeio ver a palavra "Anápolis" impressa em qualquer lugar que seja.

Estive lá hoje. Não foi tão ruim assim. Conversei com uma pessoa estranha que trabalha numa empresa na qual trabalhei a sete anos atrás, quando ela, a empresa, ainda estava engatinhando. Senti uma estranha nostalgia de um tempo em que eu tinha alguma ilusão, ao mesmo tempo em que não tinha nenhuma esperança real. Mas como o destino é interessante! Das minhas ilusões, não sobrou nada, e das falta de esperança real, surgiu inesperadamente uma saída daquele túmulo no qual vivi por cinco anos. Um túmulo de cinco andares, de cimento e vidro, numa esquina esquecida de tudo à noite, e cheia de rostos amorfos e passageiros durante o dia. O destino me tirou do meu túmulo anapolino, e me depositou num outro, no qual vivo agora, em Goiânia. Não faz muita diferença. Simplesmente vegeto de um modo diferente.

Dassault Mirage III D
Estou ouvindo Creed, mas estava ouvindo Linkin Park, Hibrid Theory, um CD que comprei a quase um ano atrás, e que estava ainda com o plástico de proteção da loja. Eu nunca me importei em ouvi-lo antes. Apenas senti uma compulsão de comprá-lo, original, depois que comprei uma versão dele, pirata, e meu amigo o roubou de mim ainda na mesa do bar, antes que eu tivesse tempo de ouvi-lo. Comprei o CD pirata do vendedor ambulante que vendia suas porcarias de mesa em mesa, e fui ao banheiro. Quando voltei, o CD tinha sumido. Meu amigo, que estava meio bêbado, gostou do CD e o escondeu, e eu fiquei puto, xinguei deus e o mundo, e ele, o meu amigo, xingou junto, mas ficou quieto e ficou com o CD. Depois, fui no shopping e comprei o CD original, paguei cinco vezes mais caro na loja e o coloquei junto aos meus muito outros CDs, ao lado do meu micro, e ele ali ficou, ainda inédito. Não, ele não foi o único que comprei e ainda não ouvi. Tem outro do Linkin Park, o Meteora, este sim, pirata, que também ainda não foi ouvido. Mas isso não é nada.


Sei que em certo sentido sou um comprador compulsivo de certas coisas que me agradam. Não que eu perca o interesse. É algo como: vou comprar agora que posso e quando eu tiver vontade eu consumo de fato. É, na verdade, um impulso meio que de pobre. Algo como um esquilo, que junta bolotas para comer no inverno. Eu, no fundo, acho que não terei outra oportunidade. Meu temor não é de não encontrar o que procuro no futuro, mas de não ter o dinheiro para comprar o que eu vier a querer. Não que eu me importe em perder o produto, porque sei que sempre haverá produtos para serem comprados. Talvez daqui a dez anos eu não encontre o CD do Linkin Park, mas haverá outras bandas boas com seus CDs para serem comprados. A questão não é essa. O que eu não quero é perder a oportunidade de gastar meu dinheiro de maneira prazerosa agora, que tenho algo de bom na mão. É como o pobre que tem de vender o almoço para comprar o jantar. Gosto desse exemplo. Tenho de aproveitar a chance de gastar bem meu dinheiro agora, porque não sei se terei dinheiro amanhã. Isso significa um desajustamento psicológico óbvio.

É duro dizer isso, mas acho que eu não tenho um bom relacionamento com o dinheiro, mas isso é assunto para uma outra história. A verdade, no momento, é que fiz bem em deixar Anápolis, fiz bem em deixar a pequena empresa em que eu gostava de trabalhar, e que era a única ilusão que eu tinha. O único funcionário que restou da época em que trabalhei ali hoje é o manda-chuva. Ele, esse manda-chuva, amigo meu, é um cara legal, e eu sei que ele, ou eu, seríamos mais cedo ou mais tarde, um dos dois, mas não os dois ao mesmo tempo, o cabeça dessa empresa, porque dávamos o sangue por ela. No fim, eu estava certo: ele chegou lá.

Por outro lado, hoje eu ganho o dobro do que ele ganha. Quem venceu? Mas dane-se isso de querer saber quem venceu e quem perdeu. Não somos inimigos. Talvez a luta ainda não tenha nem sequer começado para nós.

Uma coisa é certa: para os Mirage da Base Aérea de Anápolis, o fim chegou: um velho exemplar deles, um monstrengo velho, bicudo, cinza e de asas em delta, está agora servindo de banheiro para os pombos numa das praças principais da cidade. Um triste fim para um pássaro daqueles. E pensar que já foram a glória da aviação nacional. Pensar que pilotos arrogantes se sentiam Top Guns quando subiam, brincavam de guerra e depois desciam de um deles! Quanta vaidade!

Sim, senti uma estranha nostalgia...



2 comentários:

  1. Cara, gostei bastante das reflexões. Me identifico bastante com seus pontos: o dinheiro detido mas supérfluo, um grande vazio nostálgico e a sensação de não pertencer a nada ou lugar nenhum. Não busque a felicidade, continue escrevendo. Abraços!

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  2. Cara, gostei bastante das reflexões. Me identifico bastante com seus pontos: o dinheiro detido mas supérfluo, um grande vazio nostálgico e a sensação de não pertencer a nada ou lugar nenhum. Não busque a felicidade, continue escrevendo. Abraços!

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