quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Por que não, Karen?

A questão de número 41 da série que abordo neste blog relaciona-se a uma espécie de engodo mental, que chamou minha atenção na época em que elaborei a minha lista de perguntas sobre autoaprimoramento.

Uma pequena digressão é necessária aqui, para contextualizar a origem desta pergunta. Mas, que pergunta?

A pergunta 41 foi a seguinte:

"Por quê? E por que não? Funciona o jogo de empurra?"

Aparentemente, ela não faz muito sentido. Daí a necessidade da digressão.

Até então, todas as perguntas anteriores eram baseadas em dúvidas que surgiram em decorrência da leitura de alguns livros de autoajuda que andei lendo em 2001. Basta ler algumas postagens anteriores para que se perceba isto. Mas esta pergunta 41 relaciona-se com uma outra fonte de dúvidas. Não é uma fonte muito provável, por isso preciso explicá-la.

Em 2001, eu andava meio deprimido. Eu trabalhava, e nas horas vagas lia e ouvia música. Não estava animado a ouvir música muito agitada. Havia algo em mim que me levava a ouvir coisas melancólicas, tristes. Então, de repente, entrei em um período em que passei a ouvir muito as músicas dos Carpenters.

The Carpenters fez sucesso nos anos 70. Eu ouvia suas canções quando menino, mas nem sabia quem eram seus membros. Então, depois de adulto, redescobri a banda e suas músicas, e percebi que boa parte delas eram familiares, nostálgicas, que me faziam recordar meus primeiros 10 anos de vida.

Quem compunha os Carpenters? De repente, fiquei curioso. Eram dois irmãos. Um rapaz e uma garota. Mas a garota era a estrela.

A garota virou uma mulher, que definhou na anorexia e morreu jovem, no início dos anos 80. Uma história triste e trágica. Agora, parecia que ela cantava a própria tristeza e morte nas canções calmas que eu andava ouvindo.

Pesquisei mais. Como a banda começou? Em um vídeo na internet, a cantora contou a história do começo de tudo. Um dia, seu irmão resolveu formar uma banda. Então, eles precisavam de um baterista. Ela, que não sabia tocar nem cantar nada, se ofereceu para aprender tocar bateria. Alguém, estranhando uma garota tocando bateria em uma banda de música, perguntou: por quê? Ela, em sua irreverência juvenil, que não via limites nem inconvenientes em nada, em uma época em que as mulheres estavam se emancipando socialmente, retrucou de volta: Mas, por que não?

E começou a tocar bateria. Depois, começou a cantar, e sua voz era linda, e ela acabou virando uma estrela pop, até seu trágico fim.

A pergunta de Karen Carpenter ficou em minha cabeça.

Por que não?

Por que colocamos tantas barreiras em nossas vidas? Por que nos submetemos a restrições que outras pessoas nos impõem? Por que deixamos de fazer aquilo que desejamos fazer, simplesmente porque estamos mais preocupados com o que os outros pensam de nós do que com aquilo que nós mesmos desejamos fazer?

Ora, sempre que se fala em autoajuda, se fala em confiança, em determinação, em disciplina, em sonhos e metas a serem alcançadas. Mas, poucos ousam. Se alguém resolve nos contar algo que deseja fazer, logo perguntamos: mas por quê? E então, essa pergunta desencadeia uma série de desculpas, possibilidades, bloqueios, e por fim, planos se transformam em campos minados, em fracassos e desilusão. Quem ousa retrucar um "por quê?" com um simples "por que não?"? Vindo de uma pessoa que ousou em sua época, a pergunta não deixa de ser interessante, porque ela afasta a crítica dos indecisos, dos fracos e dos covardes. É o que podemos chamar de inversão do ônus da argumentação. Se alguém busca razões para não fazer, a pergunta inverte a lógica do questionador e busca razões para se fazer. Por que focar em problemas se podemos focar em benefícios?

Esta é a razão da pergunta.

Vamos lê-la novamente:

"Por quê? E por que não? Funciona o jogo de empurra?"

Resta agora entender o que eu quis dizer com este "jogo de empurra". O jogo de empurra é apenas uma maneira de dizer que a disputa argumentativa entre aquele que questiona a viabilidade de uma decisão e aquele que aposta no sucesso da decisão parte primeiro do questionamento crítico e cético daquele que nada faz, e acredita que ninguém mais pode ou deve fazer, e termina na busca de motivos reais para se permanecer na inação. Quais os ganhos da imobilidade, pergunta o homem de ação ao cínico que o questiona?

A ideia não é convencer o cínico. A ideia é descartar o cínico. É colocá-lo em seu lugar, e fazê-lo silenciar em sua acidez destrutiva. O homem de ações não pode se dar ao trabalho de perder tempo argumentando com o cínico. Tem muito o que fazer.

Mas, e se o cínico mora dentro da mesma mente que, cindida, abriga o sonhador?

É possível convencer a mim mesmo de que devo querer o que quero, sem críticas? É possível silenciar o crítico interior?

Contando as vantagens de se fazer e não as desvantagens, estamos sendo sensatos, ou estamos apenas nos iludindo quanto à inexistência de barreiras e riscos que se escondem em toda empreitada que mereça ser executada?

Esta é uma questão de cálculo de custos e benefícios, e não uma mera questão de retórica ou argumentação. A questão não é calar o crítico exterior ou interior. A questão é ter certeza de que não estamos entrando em uma fria. Esta não é uma decisão trivial, porque envolve autoconvencimento. Em um caso extremo, envolve mesmo o autoengano. Mas então, ao falar de autoengano, pergunto se isso realmente existe ou é possível, e então, já estamos indo longe demais.

Claro, falarei muito sobre autoengano. Mas não agora.

Por hora, basta que saibamos que o jogo de empurra existe, e ele é interessante de se jogar.

Com essas ideias em mente, fiz minha pergunta de número 42. Ela é sincera e relaciona-se intimamente com esta que acabo de apresentar. É o que veremos no próximo post.

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