domingo, 19 de janeiro de 2014

Escrevendo coisas ao longo da vida

Eu disse certa vez aqui que também certa vez no passado eu escrevera um livro.

O que tenho a dizer agora a respeito do fato de ter escrito um livro a muito tempo atrás é que ao tocar neste assunto aqui neste blog, eu o fiz para lembrar a mim mesmo que escrever é para mim uma coisa muito íntima e familiar.

Quando eu me referi ao fato de ter escrito um livro, eu fazia referência a um livro que de fato publiquei no ano de 1996.

Esse livro e sua publicação merecem um texto adequado, é certo, mas eu preciso dizer primeiro que antes de publicar este livro, que dei o título de Zago, eu já vinha escrevendo minhas coisas desde 1987.

Quer dizer, eu comecei a escrever minhas coisas quando tinha a idade de 17 anos, e não parei mais.

O que tanto escrevi nesses anos todos?

Que valor tem esses escritos para mim e para o mundo?

Não sei. Talvez nenhum valor maior do que o sentimento de realização que nos proporcionam as nossas pequenas e mundanas realizações, e que só significam algo para nós mesmos, e mais ninguém. Que seja.

Não escrevi tanto assim. Escrever dá trabalho, e não dá dinheiro, e não dá nada mais que algum prazer passageiro, mas somente depois de algum tempo, depois que nos esquecemos daquilo que escrevemos, e relemos nossas coisas com os olhos de estranhos, e ainda assim, é possível que nem prazer nos dê, mas sim vergonha e humilhação desnecessárias e evitáveis.

Como não sentir vergonha daquele poema bobo que escrevemos a vinte anos atrás, e que hoje nos parece tão feio, tolo, desnecessário? Por que tivemos a arrogância, a audácia de nos metermos a escrevê-lo, se não somos, e sabemos não ser, poetas, e nem ter na veia o sangue poético que leva os verdadeiros aspirantes a poetas a escrever, escrever, escrever, até que seus poemas não sejam tolos, ridículos, desprezíveis?

Mas, enfrentemos a vergonha. Escrever é preciso.

Eu não acho que seja um bom escritor. Nem acredito que seja escritor. Eu sou uma pessoa que foi obrigada a aprender a escrever, e isso não significa de modo algum que eu tenha aprendido a minha obrigação. Mas, achei o ato de escrever um passatempo gostoso. Não sei se escrevo bem, mas gosto de escrever.

Às vezes escrevemos coisas razoáveis. Às vezes nos metemos a falar de coisas que não conhecemos, apenas porque temos a oportunidade de colocar no papel algo que pode ser colocado no papel. Afinal, papel aceita tudo, inclusive divagações sobre aquilo que não conhecemos. É certo que o papel aceitará nossas ideias bobas, frágeis, desconexas, simplórias, amadoras. Mas não seremos poupados de reconhecer nesses escritos a bobagem, a fragilidade, a simploriedade e o amadorismo que fluiu de nossas penas simplesmente porque nos metemos a escrever sobre aquilo que não conhecíamos. Eu às vezes tenho vergonha do meu blá-blá-blá literário, e pseudo-literário, e não posso negar que reconheço o quão mal já escrevi, se é que ainda não escrevo.

Mas, não vejo no ato de escrever mal um pecado. Escrever é uma habilidade que se aprende, e mais se aprende quanto mais se escreve, e por isso tenho me esforçado a escrever o mais que posso. Quando leio algo que julgo ter escrito bem, fico orgulhoso de mim mesmo, e isso me basta. Escrevo para mim mesmo, e se leio e gosto do que escrevi, dou-me por satisfeito. Mas não no momento mesmo em que acabo de escrever.

Não. Escrever tem dessas coisas. Um texto é como um quadro, uma pintura. Precisamos dar uns passos para trás e olhar a nossa pintura de longe para podermos tê-la em perspectiva tal que possamos contemplá-la em um conjunto, e não apenas olhá-la de perto, da distância que comumente tomamos para pintá-la, porque então estamos saturados da imagem que constantemente temos diante de nós ao longo de todo o tempo em que levamos para pintá-la, e por isso, tal perspectiva, tão próxima, tão pessoal, tão íntima, não nos provoca nenhuma sensação de beleza, que é a que buscamos, mas apenas a de cansaço, de exaustão, de repetição.

Com um texto, o espaço se transmuta em tempo, e precisamos deixar que este corra para que possamos nos desintoxicar daquilo que escrevemos, e maior o tempo exigido se maior for o texto sobre o qual nos debruçamos para construí-lo. Escreva mil páginas, e precisará de mil dias para podê-las contemplar com o olhar neutro do leitor inédito.

Assim, escrevo, mas só aprecio o que escrevo algum tempo depois de ter escrito. Apreciar quer dizer aqui julgar, propriamente. Julgo o texto bom ou ruim, sem maiores indecisões. Afinal, julgo o texto de todo autor que tenha escrito algo que me caia nas mãos. Por que poupar meus próprios escritos de meu tão caro julgamento?

Assim, corrijo-me, quando posso. Vejo um texto ruim, procuro entender o que de ruim vai nele e busco não cometer o mesmo erro. 

Isso funciona? Não sei, mas eu me esforço.

Quanto já escrevi na vida?

Não sei, talvez umas mil páginas. Duas mil, quem sabe. Certamente não mais que três mil. Daria uma meia dúzia de volumes grossos.

Mas, se fossem seis volumes grossos, o que teria neles? O que valeria a pena ler?

Cartas de adolescente? Meu diário? Minha coleção de historietas? Meus dois artigos em revistas da faculdade? Minhas duas monografias? Minhas provas de faculdade? Meu livro de 1996? Minha agenda de 1999? Meu blog? Meus sites? Minha participação em fóruns da internet? Meus e-mails? Meus outros livros começados, mas não terminados? Meus projetos de livros?

Não, nada disso é sério. Nada vale muito, a não ser para mim mesmo.

Mas a seriedade não é nem será obstáculo impedindo a publicação daquilo que escrevi e escrevo. A seriedade é consequência daquilo que escrevo. A seriedade do amanhã é fruto da trivialidade de ontem e hoje. Escrever sério só se aprende escrevendo, ainda que não seriamente. Não se nasce seriamente escritor. Talvez se nasça poeta, quem sabe, mas não um escritor sério.

As minhas banalidades têm sua razão de ser. Não preciso viver daquilo que escrevo. Logo, posso ser trivial. 

Reconheço o poder das palavras, e principalmente as escritas, em comparação com as faladas. Falo pouco, embora também não dependa do falar bem para viver. A necessidade é a melhor escola, mas nunca precisei escrever nem falar bem para viver. Logo, nunca precisei me esforçar para desempenhar bem essas duas habilidades. Se sou apenas um escritor razoável, quando escrever me é prazeroso, o que dizer do meu discursar, quando não obtenho do discurso o mesmo prazer da escrita? 

Ainda assim, falo, e meu discurso é honesto, tal qual o meu escrever. Vou vivendo com eles tais como são, amadorísticas habilidades que nada rendem, exceto um prazer secundário e subsidiário. Entretanto, escrever é um prazer digno.

Cartas, poemas, diários, agendas, artigos científicos, comédias bobas, monografias, blogs, livros. O que mais posso fazer com esta minha vontade de escrever, senão dar-lhe vazão?

É certo que todo escritor quer ter seus escritos publicados. Eu também quero. E quero-os neste blog.

Mas cada coisa em seu lugar. 

Não falarei do livro Zago, de 1996, antes de falar do que escrevi em anos anteriores, porque a habilidade de escrever Zago decorreu do esforço de ter escrito outras coisas previamente. A habilidade de escrever é cronológica, e além do mais, cumulativa. Assim, falarei primeiro das minhas primeiras obras escritas: as cartas.

Mas eu já disse isso antes aqui neste blog.

Não basta prometer que falarei nelas. É preciso cumprir a promessa.

A promessa é esta: falar sobre minhas cartas neste blog.

Aposto que será uma coisa muito, muito significativa e cativante, e eu o farei.

Eu o farei.

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