quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

O gelo, o fogo e a areia

Estamos, nós, paulistas e paulistanos, quase formalmente em estado de racionamento de água. Em que pese a seriedade da situação, inimaginável a poucos anos ou mesmo meses atrás, não é difícil de aceitar a ideia de que nós, brasileiros, vivemos em um país imenso sujeito a grandes variações climáticas. 

Enchentes, frentes frias, secas, queimadas, avanço do oceano e desmatamento são temas relativamente frequentes em nosso noticiário.

O grande drama é que agora o risco de escassez de água chega à área mais densamente povoada do país, senão uma das mais povoadas do mundo.

Não falarei sobre culpa, ainda que haja evidentemente um componente humano no processo, seja ele o de excesso de consumo, falta de planejamento e  assoreamento de rios. Ninguém em sã consciência trabalharia ativa ou passivamente para gerar esse resultado. O clima em si é o grande fator incontrolável, e espero que tudo se normalize em alguns meses, seja pela queda das chuvas, seja pela transposição de rios, ou outra solução qualquer.

Não morreremos de sede, nem haverá uma catástrofe. A humanidade já sobreviveu a esse problema antes e sobreviverá agora.

Se teremos manifestações, quebra-quebra e prejuízos econômicos, parece que isso dependerá do espírito de compreensão do povo e do envolvimento ativo de todos. Afinal, não se pode esperar que o governo resolva absolutamente tudo. 

Mas, eu tenho feito muitos pequenos comentários nesse blog a respeito do problema ecológico, e acho que há alguns detalhes interessantes que precisam ser realçados.

Um dia desses eu assisti ao filme Interestelar, mais um deles, obviamente de ficção científica.

Hollywood tem tentado capitalizar sobre o problema climático e como gosto do assunto, seja o do clima, seja o da ficção científica, sempre que posso, assisto a esses filmes mais grandiloquentes e catastróficos.


Em O Dia Depois de Amanhã, a ameaça é o frio intenso que surge de uma interrupção de uma corrente marítima e acaba causando um gigantesco esfriamento na América do Norte, com tufões e furacões trazendo frio da alta atmosfera e criando uma nova era glacial no mundo. 

Em Presságio, uma anomalia no funcionamento do Sol é detectada e condenará o planeta Terra a sofrer uma rajada de calor que acabará com a civilização.

Em Interestelar, parece que houve um entendimento, uma compreensão por parte de roteiristas e produtores quanto à factibilidade de catástrofes climáticas. Assim, eles introduziram a seca, a morte de plantas, a erosão do solo, as pragas agrícolas, as tempestades de areia como pesadelo futuro. Foram espertos ao introduzir imagens de colheitadeiras e tratores drones, guiados por computador, sem motoristas, dando a entender que em um futuro árido assim, nós, humanos, ainda teríamos alguns meios com os quais lutar contra uma tragédia inevitável, mas postergável por mais algumas décadas antes do colapso final.

Um cidadão razoavelmente prudente deve ter percebido ao longo dos anos como a mídia passou a dar crédito às ameaças ecológicas e parece resignado ao fato de que algo de ruim acabaria acontecendo conosco mais dia, menos dia. Esse dia está chegando e parece que não há muito o que se fazer.

Não, não veremos o Estado de São Paulo sendo consumido ano a ano por dunas de areia varridas pelos ventos escaldantes do aquecimento global.

Mudanças climáticas sempre existiram. A espécie humana surgiu em um planeta inerentemente variável. Nossos ancestrais já enfrentaram calor maior que este que vivenciamos, enfrentou muito mais frio ainda, com glaciações intermináveis, e a areia cobre e sempre cobriu grande parte do mundo sem que tenha impedido o ir e vir do homem ao longo dos milênios.

A única coisa que o planeta nunca vivenciou foi a existência simultânea de 7 bilhões de animais consumidores dos mais variados recursos físicos disponíveis.

Vivemos sim um período com um número de seres humanos explosivo, mas nada indica que haja uma catástrofe logo ali, no ano que vem.

Teremos desafios, é certo, e precisaremos reajustar nosso modo de vida.

Mais que isso, nós brasileiros teremos de aprender a nos ver como um povo como qualquer outro, um povo sujeito às mesmas vulnerabilidades que qualquer outro. Um povo que precisa aprender a ver a frase "Deus é brasileiro" como um ponto fraco, e não como uma bênção e um patuá que o protege, como se dotado de um corpo fechado contra males de todos os tipos.

Essa frase tem nos cegado ao longo das décadas. 

Agora, ou abrimos os olhos ou eles se encherão de areia.

Brasileiros: bem-vindos à realidade do mundo!

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