A perdição do pobre é a pobreza.
Alfred Marshall, economista inglês, foi quem o disse, e concordo com ele.
A mente humana pode muitas coisas, e um de seus poderes é a capacidade de sentir empatia por outros humanos, a capacidade de simular, emular o sentimento íntimo de outra mente, que não a sua própria. Mas a empatia tem limites. Como simulação, é um pálido espantalho perto do que realmente sente o ser original. A empatia só é mais real na medida em que quem a sente já tenha ou não vivenciado situação igual ou parecida com a que tenta emular.
É fácil sentir, por exemplo, empatia por um pobre coitado cidadão irritado por estar atrasado para o trabalho de manhã e que, furioso, mete a mão na buzina do carro e resfolega sozinho contra o trânsito que não anda. É fácil porque quase todo mundo já passou por situação parecida em grandes cidades. Sabemos como é a situação, e assim, fica fácil entender o que vai pela cabeça do sujeito irritadiço.
Mas não é fácil um homem, um exemplar adulto do sexo masculino, sentir empatia por uma mulher, um exemplar adulto do sexo feminino, quando esta relata a experiência de um parto pessoal. Sabemos o que é dor, mas nós, homens, não temos úteros, e não é fácil fingir que temos um. Também não é fácil sentir empatia por uma série de situações que não fazem parte de nossa realidade.
A pobreza é uma dessas situações.
Para uma pessoa que nunca foi pobre, é muito difícil sentir verdadeira empatia por quem foi ou é pobre. Quem nunca foi pobre não tem poder mental suficiente para recriar as milhares de pequenas coisas que formam, em seu conjunto, aquilo que chamamos pobreza.
Isto não significa que a pobreza seja uma condição que seja digna de orgulho ou de honra. Poucos, afinal, escolhem ser pobres. E ninguém tem o poder de escolher nascer pobre. Simplesmente nasce-se pobre. E quem, não tendo nascido pobre, vem a ser por um motivo ou outro, se pudesse, evitaria a pobreza. Há, claro, abnegados, tais como certos religiosos, ou profissionais, como médicos, cuidadores, pesquisadores, que se submetem a um ambiente de pobreza com o fito de lutar contra ela, mas esta é uma decisão bem pensada, e por isso mesmo, não definitiva. Um padre pode cansar-se de um lugar pobre e ir para outro local menos áspero. Não está apegado à pobreza como está o próprio pobre.
Assim, o pobre, que não pode emular, por sua vez, a não pobreza, mantém-se onde está, na sua perdição. Se pudesse de fato saber que há algo melhor que a pobreza, poderia lutar para obter este algo. Mas então, estamos indo longe demais, porque não há somente uma questão de ignorância de status social e de decisão de ficar ou mudar. Há forças maiores que a mera ignorância que prendem o pobre à sua pobreza. O conforto proporcionado pelo abandono da pobreza não é estímulo suficiente para que um pobre se esforce para deixar de ser pobre. O brilho do conforto se apaga diante de outras luzes que o convidam a ficar onde está.
Que brilhos são estes?
Há muitos.
O conformismo, a preguiça, a enorme dificuldade da tarefa de mudança, as ameaças religiosas e filosóficas, os obstáculos da própria sociedade, a exigência quase sempre necessária de mudança física de um lugar querido para outro absolutamente ameaçador e estranho, enfim, há mais forças lutando para que o indivíduo fique onde está do que forças lutando para que ele mude.
A perdição do pobre é a pobreza, disse Marshall, um economista.
O que mais a Economia tem a nos ensinar?
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