sábado, 10 de novembro de 2012

Um grande erro de raciocínio

Eu escrevi aqui, dando continuidade a algumas dúvidas sobre por onde começar nossa história:

"por que sou quem sou?

Sou quem sou porque nasci no dia em que nasci, sou filho de quem sou, vivi onde vivi e cresci onde cresci. Sou em parte fruto da genética e parte fruto do ambiente. Sou em parte condicionado pela genética e pelo ambiente, e em parte sou livre para decidir sobre minha vida. Em parte sou condicionado por forças que não posso controlar, e em parte sou livre. Meu futuro depende de decisões que posso tomar com minha liberdade. Minhas decisões, no entanto, estão limitadas pelas condições que estão além do meu controle. Assim, meu futuro depende, em parte, do meu passado imutável, que condiciona o que posso decidir no futuro. Afinal, eu não posso decidir não ter sido mais o que já fui. Posso não gostar do que fui, mas não mudar o passado.

Agora, fui o que fui devido a eventos ocorridos antes de eu ter vindo ao mundo. Fatos óbvios tais como as escolhas de meus pais, avós e bisavós determinaram o local onde nasci, a época em que nasci. Então, seria fácil determinar um marco a partir do qual eu poderia começar a contar minha história pessoal. Esse marco seria o momento ou época em que mais fundo conseguimos aprofundar no passado de nossos parentes conhecidos.

Esse, porém, não é um marco perfeito. Não podemos dizer que nosso destino foi parcialmente traçado no nosso passado em virtude apenas de ações de nossos antepassados. Eu poderia dizer que nasci no Brasil porque em algum momento no passado um indivíduo qualquer resolveu migrar da Europa para a América por motivos pessoais. No entanto, essa decisão pessoal, que exerceu uma forte influência sobre meu destino, só foi possível em parte porque em um determinado momento os europeus descobriram a América.

Ora, eu poderia ter nascido um índio americano em 1332. Neste caso, eu não poderia ter meu destino influenciado por um fato futuro, tal como o descobrimento da América pelos europeus. Eu teria que justificar ou explicar meu destino com base em outros fatos passados. Eu poderia então argumentar que nasci índio em 1332 porque em algum momento, no ano 6.753 a.C. um ancestral meu resolveu rumar da região da América Central para a América do Sul devido a uma seca terrível em sua terra natal. Ora, concluímos que se pensarmos assim, todos os fatos passados anteriores a meu nascimento influenciam minha vida, sejam eles resultados de decisões de parentes ancestrais ou não, sejam eles decisões de humanos ou não, sejam eles mero acaso ou não. Qualquer coisa pode ser considerada um fato que veio a afetar meu destino. Até a queda de um meteoro, que dizimou os dinossauros, é assim relevante, já que permitiu o surgimento dos mamíferos. Ora, sou um mamífero. Se não fosse o fim dos dinossauros, eu provavelmente não existiria. E assim com todos os fatos passados, sem exceção. E neste caso, escrever sobre os fatos que concorreram para o meu nascimento implica praticamente na narração de todos os fatos já ocorridos no universo. Dá a falsa impressão de que o universo surgiu para que eu pudesse existir, o que é um grande erro de raciocínio.

O universo não existe somente para que eu exista."

Muita gente parece não entender este erro.

Mas eu consigo compreender o porquê de muita gente não dar conta deste erro sutil. É que nossa existência é algo de difícil compreensão. Poucos se aventuram e retornam sem manchas deste profundo e insondável mistério existencial, coberto das mais turvas águas.


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